04/12/1962 -

Remodelação ministerial, saindo do Governo Adriano Moreira, Mário Silva e Kaúlza de Arriaga.

No Ministério da Defesa, Gomes de Araújo substitui Salazar; no Exército, Luz Cunha substitui Mário Silva; e no Ultramar, Peixoto Correia substitui Adriano Moreira; na Secretaria de Estado de Aeronáutica, Francisco António das Chagas substitui Kaúlza de Arriaga.

Kaúlza de Arriaga saíu do Governo porque Salazar não admitia estar numa posição de devedor perante os seus subordinados – e Kaúlza, ao fazer abortar o golpe de Botelho Moniz e de, em última instância, ter salvo o ditador, tornara-se um credor potencial. No caso de Kaúlza tratou-se de afastar alguém que prestou um favor inadmissível.

Quanto à substituição dos restantes ministros tratou-se, para Salazar, de voltar a concentrar nas suas mãos algum do poder de que ensaiara abrir mão.

Para a Defesa entra um fiel, Gomes de Araújo, que liberta Salazar para as tarefas da governação.

Para o Exército entra Luz Cunha, um jovem oficial de Engenharia, intelectualmente prestigiado, para substituir o rude Mário Silva, que criava demasiados anticorpos entre os militares.

A mudança mais significativa é a substituição do enérgico e brilhante Adriano Moreira por Peixoto Correia, um apagado oficial de Marinha, que fora governador da Guiné, substituído no âmbito de um processo de conflito de competências com o comandante-chefe Louro de Sousa, e que se arrastava como membro do Conselho Ultramarino.

Depois da experiência com Adriano Moreira, que agitou as águas da política ultramarina e ameaçou alguns interesses, Salazar voltava à segurança de um funcionário para administrar o Ultramar.

Adriano Moreira e Salazar

A experiência ministerial que Salazar proporcionou a Adriano Moreira em 1961, logo após o golpe Botelho Moniz, parece indicar que, nesta data, o ditador admitia alguma evolução no estatuto político das colónias.

Quanto a Salazar, não se sabe até onde admitia ir. Conhecem-se conversas em que ele referiu, tal como Kaúlza de Arriaga confidencia nos seus escritos, que a independência era uma questão de tempo para preparar as elites africanas. O que queria dizer que os quinhentos anos de colonização e os oitenta de colonialismo depois da Conferência de Berlim não haviam chegado.

Acampamento da PAIGC com uma foto de Amílcar Cabral. [livro Guinea Bissau]

Quanto a Adriano Moreira não se conhece em absoluto o seu projecto para as colónias portuguesas, nem a solução que propunha para o problema colonial.

Sendo Adriano Moreira um intelectual, mais do que político executivo, o facto de ter aceitado ser ministro do Ultramar só pode querer dizer que o seu projecto era o de manter uma solução unificada de Portugal e Ultramar, o que excluía, à partida, a independência.

O que fazer com as colónias?

A incapacidade de responder à pergunta – o que fazer com as colónias, ou com as províncias ultramarinas, ou com as possessões? – não é uma falta grave de que Adriano Moreira possa ser acusado. A falta de qualquer ideia para o futuro das colónias que não fosse mantê-las sob domínio português era comum a todos os dirigentes políticos de direita e de esquerda. Democratas ou defensores da ditadura, maçons ou católicos, socialistas e liberais, com excepção dos comunistas, todos se mantinham na prudente posição de Norton de Matos, de defensores do domínio colonial.

Adriano Moreira defendia, ao que se sabe, um certo grau de autonomia para as colónias, mas a questão era saber a quem era concedida essa autonomia e como.

Logo que tentou arbitrar o conflito entre os velhos colonos proprietários de terras e as multinacionais dos diamantes e dos minérios, Adriano Moreira perdeu o apoio de uma parte das forças vivas de Angola, que preferiram jogar pelo seguro, apoiando Venâncio Deslandes.

Mas, por outro lado, só após a saída de Adriano Moreira do Governo as grandes famílias da finança portuguesa investem Angola. Só a partir de 1963, os grandes grupos nacionais se fixam em Angola. O que pode querer dizer que Adriano Moreira não lhes inspirava confiança.

É a falta desses apoios de facto, do grande capital português, que permite perceber as razões por que Adriano Moreira não teve qualquer hipótese de suceder a Salazar. Marcelo Caetano tinha credenciais colonialistas muito mais sólidas do que Adriano Moreira e os financeiros
portugueses foram sempre homens de negócios de curto prazo e bons aproveitadores das oportunidades de enriquecimento rápido em África.