Comunicação de Salazar ao país através da rádio e da televisão.
Em 12 de Agosto de 1963 Salazar faz uma intervenção dramática a respeito de África, transmitida pela rádio e pela TV: “Havemos de chorar os mortos se os vivos os não merecerem”.
Salazar recusava a independência das colónias africanas, uma vez que eram “criação portuguesa”. Quanto à guerra, prometeu “a defesa dos territórios que constituem Portugal até ao limite dos nossos elementos humanos e dos nossos recursos”.
O discurso de Salazar sobre o problema do Ultramar teve grandes repercussões internacionais e levou os nacionalistas a reafirmarem a continuação da luta.
Salazar classificou a “Nação portuguesa como um Estado unitário na complexidade dos territórios que a constituem e dos povos que os habitam”, referindo a realização de um acto solene e público.
Cerimónia de apoio dos generais e oficiais superiores a Salazar e à política ultramarina, na sequência do seu discurso, realizada nos Passos Perdidos da Assembleia Nacional.
O ano de 1963 foi fértil em resoluções condenatórias da política colonial portuguesa um pouco por toda a parte e em especial nas Nações Unidas. Para responder a essa pressão, que levou Salazar a lamentar-se num discurso proferido a 12 de Agosto: “Confesso que é preciso um pouco de coragem para ouvir imperturbável o alarido que se levanta contra Portugal”, os chefes das Forças Armadas reuniram-se nos Passos Perdidos da Assembleia Nacional para exprimirem a Salazar o seu apoio à política do Governo.
Dias depois seria a vez de uma grande manifestação popular no Terreiro do Paço.
Manifestação nacional no Terreiro do Paço, em Lisboa, de apoio à política ultramarina do Governo, que serviu de base à legitimidade da política de defesa ultramarina do Governo português.
Franco Nogueira refere no volume V da biografia de Salazar que estiveram presentes 250 a 300 mil manifestantes e descreve o ambiente:
“Salazar está a uma das janelas da ala ocidental da praça. Em baixo, empunhados pelo povo, agitam-se cartazes, bandeiras, dísticos; há vozearia, vibração, espírito de cruzada que mobiliza os que sentem identidade de propósitos; e sucedem-se, pronunciados da janela onde se encontra o chefe do Governo, os discursos de exaltação patriótica, de fé no Ultramar, de adesão pessoal a Oliveira Salazar ”.
No final, Salazar fala à multidão: “Não temos só o dever de merecer os mortos; temos também o dever de ser orgulhosos dos vivos”.
Início das conversações de George Ball, subsecretário de Estado americano, com Franco Nogueira e Salazar em Lisboa, em que se evidenciam as divergências relativamente aos conceitos de autodeterminação e do factor tempo no problema africano. No dia seguinte, George Ball debate com Salazar a atitude americana face à política colonial portuguesa e a presença dos EUA nos Açores.
De acordo com Luís Nuno Rodrigues “tratou-se de mais um esforço (que veio a revelar-se como o derradeiro) da administração de John Fitzgerald Kennedy para chegar a um entendimento formal com o Governo português acerca da questão colonial, através da sugestão de um plano para a descolonização dos territórios portugueses dentro de um prazo determinado. Apesar de demonstrar um empenhamento genuíno por parte dos Estados Unidos de resolver os seus diferendos com Portugal e contribuir para a resolução da questão colonial portuguesa, esta iniciativa não teve qualquer resultado prático, uma vez que o enviado norte-americano deparou com a completa intransigência do chefe do Governo português” (Kennedy-Salazar: a crise de uma aliança. As relações luso-americanas entre 1961 e 1963. Lisboa: Editorial Notícias, 2002).
O secretário-adjunto para os Assuntos Africanos do Governo dos Estados Unidos, Mennem Williams, declara em Washington que Portugal “continua adesempenhar em África um papel importante”.
Américo Tomás parte no navio Infante D. Henrique. Foi a sua primeira viagem a Angola, após o início da guerra.
Enquanto Salazar foi presidente do Conselho de Ministros, coube a Américo Tomás visitar as colónias e representar o papel de figura unificadora e simbólica do regime e da ficção de nação pluricontinental e multirracial que o regime se esforçava por impor quer externa quer internamente.
Salazar, com as suas fobias e desconfiança, jamais visitou os territórios do império.
Com a substituição de Salazar por Marcelo Caetano, as visitas de Américo Tomás aos territórios de África continuaram, agora para garantir que na cúpula do Estado ele se mantinha como o garante da política colonial de intransigência.
Reunião secreta entre Agostinho Neto e um representante do Governo português.
Agostinho Neto teve em 1963 encontros secretos com um representante do Governo português, para preparar uma cimeira que nunca se realizou.
O Governo português procurava aproveitar a situação de fraqueza do MPLA para o atrair à sua política e acentuar as divergências com a FNLA, naquela época no máximo da sua força e prestígio junto da OUA.
Era a primeira versão da estratégia “o inimigo do meu inimigo é meu amigo” que anos mais tarde utilizaria com sucesso junto da UNITA no Leste de Angola, na sequência da Operação Madeira, aliciando Jonas Savimbi e colocando-o a combater o MPLA a troco da promessa de um lugar na administração de Angola.
O problema é que Agostinho Neto não era Jonas Savimbi….
Encontros
Agostinho Neto reuniu-se por cinco vezes com um representante do Governo português em Leopoldville (actual Kinshasa), durante o ano de 1963. Os encontros destinavam-se a preparar uma cimeira com as autoridades de Angola, que chegou a estar aprazada para 23 de Setembro de 1963, em Cabinda.
Um relato pormenorizado das conversações consta de um ofício de cinco páginas do então governador-geral de Angola, Silvino Silvério Marques, para o ministro do Ultramar, Peixoto Correia. Datado de 22 de Outubro de 1963, o documento tem a classificação de “muito secreto” e encontra-se no Arquivo Oliveira Salazar.
No Verão de 1963 o MPLA atravessava uma das crises mais agudas da sua história, a República do Congo, onde o MPLA estava instalado, privilegiava claramente o rival FNLA, de Holden Roberto, que conhecia um dos seus momentos mais altos depois de a OUA ter reconhecido o Governo Revolucionário de Angola no Exílio (GRAE), criado pela FNLA, e intimava o MPLA a integrar-se naquela estrutura. Em Junho, a polícia congolesa tinha assaltado a sede do MPLA em Leopoldville e detido temporariamente Agostinho Neto e Lúcio Lara, responsável pelo departamento de organização.
Neto falhou a constituição da Frente Democrática de Libertação de Angola, um fracasso que levou ao afastamento do anterior líder do movimento, Mário Pinto de Andrade. Antes, fora a ruptura de Viriato da Cruz, que acabou por ser expulso do MPLA.
Foi neste contexto de profunda crise interna e externa que ao Governo de Luanda chegam, em princípios de Junho de 1963, informações de que “alguns dos elementos directivos do MPLA mostravam desejos de regressar a Angola”. À frente do Governo de Luanda estava, desde Novembro de 1962, Silvino Silvério Marques.
Silvério Marques e Agostinho Neto conheciam-se de Cabo Verde, onde o primeiro era governador quando o segundo ali estava deportado.
Com o beneplácito de Lisboa, Silvério Marques decidiu promover o estabelecimento de contactos com o intuito de sondar as intenções de Neto e de outros dirigentes do MPLA. Foram dadas instruções ao capitão Luís Demony, representante das linhas aéreas angolanas, DTA, em Leopoldville e este organizou uma primeira reunião a 26 de Julho, no apartamento de um cidadão português na capital do ex-Congo Belga.
O interlocutor de Demony foi o próprio Agostinho Neto, a quem Demony explicou as razões da iniciativa – Portugal estava, em termos militares, em situação de força e eram conhecidas as graves dificuldades reveladas pelos dirigentes do MPLA, perseguidos em Leopoldville e metidos numa causa de antemão perdida. Razões pelas quais Luanda decidira abrir as portas de Angola, “terra de todos nós”, aos próprios dirigentes do MPLA, porque não os consideravam, “por ora”, criminosos de delito comum, “como eram os da UPA” – a antecessora da FNLA, responsável pela onda de terror de Março de 1961.
Resposta de Agostinho Neto
Agostinho Neto definiu-se como um lutador “por um ideal democrata”, mas sublinhou que “não aceitava” a doutrina portuguesa sobre as províncias ultramarinas, já que Angola “aspirava a ser um país livre, mas ligado por laços de amizade e interesse recíproco a Portugal”.
Nestes termos, declarou “não ser português mas sim angolano, embora casado com uma portuguesa” e quis saber se estava nas intenções de Lisboa a publicação de qualquer diploma no género da lei quadro francesa sobre a independência das suas colónias africanas e se o MPLA poderia “concorrer” às próximas eleições legislativas, previstas para Março do ano seguinte.
O capitão Demony confessou não estar habilitado a entrar em conversações sobre temas daquela natureza e procurou convencer Agostinho Neto sobre a vantagem de contactar directamente as autoridades portuguesas. Propôs a Neto que fosse pessoalmente a Luanda, responsabilizando-se pela sua segurança pessoal, mas não para “discutir ou sequer falar de autodeterminação ou independência”, já que, para isso, não valeria a pena, mas sim para “trabalhar para a valorização do território” bem como para “exterminar duma vez o terrorismo”.
A conversa termina com Neto a pedir “para reflectir” e a propor um “novo encontro”, solicitando até lá “o maior sigilo e nenhuma propaganda”. O assunto é discutido no dia seguinte, numa reunião do MPLA na outra margem do rio Congo, em Brazzaville.
[Arquivo Oliveira Salazar, ANTT. Nota: Um relato pormenorizado das conversações consta de um ofício do governador-geral de Angola, Silvino Silvério Marques, para o ministro do Ultramar, Peixoto Correia, datado de 22 de Outubro de 1963.]
Ataque à Embaixada de Portugal em Kinshasa (República do Congo).
A 21 de Setembro, o Congo apresentara uma queixa contra Portugal no Conselho de Segurança das Nações Unidas, com base em notícias de que Portugal preparava um ataque àquele país e que já tinha concentrado forças para esse efeito no Luso, Angola.
Portugal mantinha unilateralmente uma embaixada no Congo (nesta data chamada República do Zaire) para apoiar a comunidade portuguesa e para recolha de informações e o Governo congolês tolerava esta situação dado ser o caminho-de-ferro de Benguela uma das vias de escoamento das matérias-primas do seu interior.
As relações entre a embaixada e o Governo congolês variavam de acordo com as necessidades de afirmação deste no plano interno e com as de escoar os seus produtos.
O ataque de 23 de Setembro foi a mais grave manifestação de hostilidade do Governo congolês (zairense) e dele resultou a destruição do interior do edifício, que foi saqueado e incendiado. O pessoal diplomático foi preso ou expulso, entre ele o embaixador António Ressano Garcia, levado para local desconhecido de onde só foi libertado três dias depois.
Após o corte de relações, os interesses de Portugal em Kinshasa passaram a ser representados pela Espanha.
Relatório do chefe de uma Equipa Especial de Informações em Moçambique sobre a situação no Norte do Distrito de Cabo Delgado, junto à fronteira com a Tanzânia: “Continuam a fazer–se promessas que sabemos de antemão não se cumprirem”.
Extracto do relatório de 30 de Setembro do chefe da Equipa 109/C sobre a situação entre Mocímboa do Rovuma e Nangade, Norte de Moçambique:
“A população autóctone continua à espera que os seus mais prementes problemas sejam resolvidos. Cada vez mais julgo que, se se houvessem resolvido os problemas económicos e sociais das massas negras, poderíamos estar numa posição mais confortável (…) em Nassombe nunca houve enfermeiro, o posto de Negomano não tem medicamentos, a Delegação de Saúde de Mueda ainda só recebeu os medicamentos referentes ao primeiro trimestre do ano e há pouco tempo o autóctone passou a pagar os tratamentos (1$00) tendo as autoridades administrativas recebido ordem para nas “banjas” informarem que uma vez que passavam a pagar haviam que ter sempre medicamentos. Continuam a fazer-se promessas que sabemos de antemão não se cumprirem.
Nos tempos que correm suponho que tais atitudes, em vez de nos aproximarem das populações, pelo contrário nos afastam.”
Este relatório é interessante por explicar a situação na zona de Mueda, um ano antes da guerra começar a 24 de Setembro de 1964.
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