1963 - Guiné, uma nova frente de combate

OS COMANDOS

Os Comandos nasceram no Exército Português como forças especiais. A criação dos Comandos correspondeu à necessidade do Exército dispor de unidades especiais de contraguerrilha, particularmente adaptadas ao tipo de guerra que em 1961 começou em Angola e que depois se estendeu à Guiné e a Moçambique. Estas unidades estavam preparadas para:

• Realizarem acções especiais em território português ou no estrangeiro;

• Combaterem como tropas de Infantaria de assalto;

• Dotarem os altos comandos políticos e militares de uma força capaz de realizar operações irregulares.

Assalto a um acampamento no Leste de Angola. [AHM]

 

Os Comandos portugueses participaram em todo o tipo de operações, com unidades especialmente organizadas para cada uma delas, desde as irregulares aos assaltos de características de guerra convencional, como aconteceu por vezes nos últimos anos da guerra, chegando a actuar com efectivos superiores a um Batalhão, apoiados por Artilharia e Aviação.

A história dos Comandos portugueses começa em 1962, quando em Zemba, no Norte de Angola, foram constituídos os primeiros seis grupos daqueles que seriam os seus antecessores. Para a preparação destes grupos foi criado o Centro de Instrução Especial de Contraguerrilha, CI 21, que funcionou junto do Batalhão de Caçadores 280, comandado pelo tenente-coronel Nave e que teve como instrutor o fotógrafo italiano Dante Vachi, que tinha experiência das guerras da Argélia e da Indochina.

Os seis grupos preparados neste centro obtiveram excelentes resultados operacionais.

Contudo, o comando militar em Angola decidiu reequacionar a instrução e a integração destas unidades na orgânica do Exército. Em 1963 e 1964, foram criados os Centros de Instrução 16 e 25 (CI 16 e CI 25) na Quibala (Angola). Surgiu então, pela primeira vez, a designação de “Comandos” para as tropas aqui instruídas.

Em Fevereiro de 1964 iniciou-se na Namaacha (Lourenço Marques) o 1º Curso de Comandos de Moçambique e em Julho do mesmo ano em Brá (Bissau) o 1º Curso de Comandos da Guiné.

Revista a uma cubata de um acampamento. [AHM]

 

Instrução e confiança – aquilo que distingue os Comandos

Em Portugal, os Comandos nasceram na guerra e para fazer a guerra. A instrução tinha o objectivo de prepará-los para a fazer e obedecia a duas características – a prática e o realismo – e assentava em duas vertentes – a técnica de combate e a preparação psicológica. Tudo isto tendo por base uma selecção física e psíquica com padrões elevados, embora tivessem decrescido com o desenrolar da guerra.

Primeiro crachá de Comandos. [CD/DN]

A preparação psicológica para a guerra foi talvez o aspecto que mais distinguiu os Comandos. O seu objectivo era transformar o homem num militar confiante em si, autodisciplinado, competente e eficaz em combate, apto a combater em quaisquer situações e condições.

A componente psicológica era, porventura a mais marcante da sua instrução, no pressuposto de que a sua principal arma era a sua própria vontade.

Para apurar o domínio da vontade sobre todos os instintos, a dureza física da instrução dos Comandos atingia os limites das capacidades de resistência dos candidatos. A instrução dos Comandos pretende sempre fazer de cada um o dono da sua vontade.

Organização

Na sua primeira fase, os Comandos organizaram-se em grupos independentes a partir de voluntários dos Batalhões de Caçadores, constituindo as suas unidades de intervenção. O sucesso destes grupos fez com que passassem a ser empregues à ordem dos comandantes-chefes e comandantes militares, para a realização de operações especiais.

Um Comando camuflado na mata. [AHM]

Organização dos Grupos (tipo):

• Uma equipa de comando (um oficial, um rádio-telegrafista, um auxiliar de enfermeiro/socorrista, dois atiradores)

• Três equipas de manobra (um sargento e quatro atiradores cada)

• Uma equipa de apoio (um sargento, um apontador de lança-foguetes, um municiador, dois atiradores).

Esta organização de um grupo a cinco equipas e cada equipa a cinco elementos sofreu adaptações, mas a célula base, a equipa de cinco elementos, manteve-se durante toda a guerra.

Grupos independentes de Comandos foram organizados e combateram em Angola e na Guiné, contudo o evoluir da guerra revelou a necessidade de maiores efectivos e de unidades autónomas, com capacidade para operarem durante períodos mais longos e de se auto-sustentarem, razões que levaram à constituição de Companhias de Comandos.

A primeira Companhia de Comandos foi formada em Angola e a sua instrução teve início em Setembro de 1964. O seu comandante, o capitão Albuquerque Gonçalves, recebeu o guião da unidade em 5 de Fevereiro de 1965.

A 2ª Companhia teve como destino Moçambique, comandada pelo capitão Jaime Neves.

Iniciava-se assim um processo que levou à formação das seguintes unidades:

23 Companhias, que combateram em Angola;

26 Companhias, que combateram em Moçambique, das quais nove constituídas localmente;

12 Companhias, que combateram na Guiné, das quais três africanas constituídas em permanência.

Capa de folheto. [AMN]

A escola francesa e a escola belga

A organização e os princípios organizativos dos Comandos portugueses foram inspirados na Legião Estrangeira francesa e nos Pára-Comandos belgas. Fundam-se numa grande mobilidade e criatividade e em técnicas de combate para a contraguerrilha muito bem definidas e capazes de suportar a inovação permanente.

A composição e a organização das Companhias de Comandos foram sempre adaptadas às circunstâncias e às situações, embora ao longo da guerra seja possível verificar dois modelos principais que deram origem ao que se pode designar por “Companhias ligeiras” e “Companhias pesadas”.

As primeiras eram constituídas por quatro grupos de Comandos, cada um com quatro grupos, com um efectivo de oitenta homens combatentes e uma reduzida componente de apoio de serviços. Estas Companhias dispunham de pequena capacidade para se manterem de forma autónoma durante longos períodos de tempo, pois destinavam-se a servir de reforço temporário a unida des em quadrícula, como forças de intervenção e receberiam dessas unidades todos os apoios necessários. Nestas Companhias privilegiava-se a mobilidade e a flexibilidade de emprego e foram inicialmente empregues na Guiné e em Moçambique.

As “Companhias pesadas” tinham cinco grupos de Comandos a cinco equipas, num total de cento e vinte cinco homens combatentes, aos quais se juntava uma formação de pessoal de serviços de cerca de oitenta homens, com médico, pessoal de comunicações, transportes, alimentação, enfermagem.

Um outro tipo de organização foi ainda adaptado para as Companhias de Comandos africanos que foram constituídas na Guiné, tendo sido dotadas de militares metropolitanos à medida das necessidades, um pouco à semelhança do que as forças especiais americanas faziam no Vietname com os “advisers”.

O evoluir da guerra levou à necessidade de criar Batalhões de Comandos nos teatros de operações da Guiné e de Moçambique. A natureza das operações passou a exigir unidades de elevados efectivos, assim como a realização, em simultâneo, de acções especiais e irregulares. Em Angola, a função de unidade-mãe foi, desde a sua fundação, desempenhada pelo Centro de Instrução de Comandos, o qual teve também de se adaptar, separando a actividade de instrução e reunindo as unidades operacionais num aquartelamento no Campo Militar do Grafanil, perto de Luanda, embora sem nunca ter autonomizado por completo o emprego operacional sob um comando específico.

Pelo contrário, na Guiné e em Moçambique, constituíram-se grandes unidades de Comandos, como o Batalhão de Comandos da Guiné e o Batalhão de Comandos de Moçambique.

Embora o Centro de Instrução de Comandos de Angola fosse a casa-mãe e tenha sido nesse centro que se formou o núcleo principal da doutrina de emprego e da mística dos Comandos, os batalhões ministravam instrução ao seu pessoal e formavam unidades para intervir no seu teatro de operações.

Além deste centro, que preparou unidades destinadas a Angola e Moçambique, tendo formado ainda os primeiros Comandos da Guiné, também em Portugal foi criado um centro de Comandos, no Centro de Operações Especiais em Lamego, o qual instruiu unidades mobilizadas para a Guiné e Moçambique.

Os Comandos portugueses foram formados em Zemba (Angola) a partir de 1962, em Quibala (Angola) desde 1963, em Namaacha (Moçambique) e em Brá (Guiné) desde 1964, em Luanda (Angola) a partir de 1965, em Lamego em 1966 e em Montepuez (Moçambique) a partir de 1969.

Folheto de acção psicológica. [AMN]

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