O Gabinete do Plano do Zambeze (GPZ)
Na sequência da adjudicação do empreendimento de Cahora Bassa ao consórcio ZAMCO, foi criado o Gabinete do Plano de Desenvolvimento da Região do Zambeze (GPZ), directamente dependente do ministro do Ultramar, para o qual foram transferidas as competências anteriormente atribuídas à Missão do Fomento e Povoamento do Zambeze e ao Grupo de Trabalho para o Zambeze. Ao GPZ competia superintender e fiscalizar a execução dos trabalhos a realizar pelo consórcio vencedor do concurso, mas também promover o desenvolvimento económico e social do espaço compreendido na bacia hidrográfica do Zambeze, objectivos que passavam pelo aproveitamento dos recursos naturais, o progresso socioeconómico das populações locais e o aumento da densidade populacional. Foi neste quadro político, legal e financeiro que se iniciou, ainda antes do fim de 1969, a construção da primeira fase do empreendimento hidroeléctrico de Cahora Bassa, que incluía, além da barragem, a central escavada na margem direita do rio, a linha de transporte de energia eléctrica em corrente contínua entre o Songo e Apollo, na República da África do Sul, a subestação conversora do Songo, a malha urbana de apoio, bem como diversos trabalhos complementares de apoio à obra principal, nomeadamente a construção e beneficiação de vias de acesso, com vista ao transporte de todo o material necessário à construção do empreendimento.
Cahora Bassa: mais que uma barragem
Quando, em 1969, o ministro da Economia, Dias Rosas, contestou que o Estado Português fosse o avalista da barragem e deixasse fora dos riscos a África do Sul, que seria o principal cliente, Franco Nogueira, o ministro dos Negócios Estrangeiros, ripostou que a barragem não era um negócio, mas o símbolo da vontade de Portugal permanecer em África! De facto, Cahora Bassa é o exemplo clássico do divórcio entre política e racionalidade.
A guerra e a segurança: os militares garantem a defesa
Antes de avançar para a construção, o Governo obteve a garantia da segurança do empreendimento e da linha de transporte por parte dos comandos militares. Sá Viana Rebelo, o ministro da Defesa, baseou o seu compromisso em duas hipóteses:
Enganou-se redondamente. A FRELIMO estava a introduzir guerrilheiros na zona desde 1968 e já tinha bases e efectivos a sul do Zambeze quando a barragem começou a ser construída. Quanto às populações, uma desastrosa política de deportação de populações e de aldeamento forçado criou as condições de rejeição à política portuguesa que as atirou para a FRELIMO.
Para agravar a situação militar, Kaúlza de Arriaga, o novo comandante-chefe, estava mais interessado em representar o papel de grande general em operações, em vez de tentar vencer uma guerra, e foi lançar a grande Operação Nó Górdio no longínquo planalto de Mueda, onde nada de valor se jogava.
A armadilha financeira do regime
A vertente ideológica da barragem teve a sua tradução no sistema de financiamento da barragem, aquele que Dias Rosas, ministro da Economia, considerou ser um risco inadmissível, ao transformar o Estado Português em avalista do empreendimento e ao estabelecer o escudo português e o rand sul-africano como as divisas de referência e não o dólar, ou um cabaz de divisas que minimizassem os riscos de possíveis desvalorizações, como aconteceu.
Esta assumpção de riscos e responsabilidades era, de facto, uma perversidade deliberada do regime que, com esta decisão, armadilhou qualquer decisão das gerações futuras. Os integracionistas do regime, aqueles que se opunham à mais ligeira autonomia das províncias do Ultramar, que consideravam um sacrilégio o Estado Federado, impuseram que fosse o Estado Português, unitário do Minho a Timor, a obrigar-se a correr todos os riscos financeiros da obra. Era a sua forma de agrilhoarem os portugueses com a bola de ferro da sua visão do mundo. Na realidade esta armadilha financeira foi tão difícil e tão custosa de desmontar que criou um problema que se arrastou até 2005.
Cookie name | Active |
---|---|