Substituição de Bettencourt Rodrigues por Barroso Hipólito na Zona Militar Leste, em Angola.
O acordo entre as autoridades portuguesas e a UNITA de Savimbi, estabelecido em 1971 na Zona Militar Leste, conhecido pelo nome de código de Operação Madeira, tinha permitido garantir não só a neutralidade da organização de Savimbi, mas ainda ganhar um aliado na luta contra o MPLA, o inimigo principal. A Operação Madeira era vantajosa para ambas as partes. As autoridades portuguesas jogavam na possibilidade de integrarem Savimbi e os seus homens na “ordem portuguesa”, e entretanto economizavam forças, tendo os guerrilheiros da UNITA a combaterem contra o MPLA.
Enquanto para Savimbi a situação lhe proporcionava tempo para desenvolver o seu movimento, tempo para ver como evoluía a situação, e o libertava de ter de se defender das forças portuguesas e sul-africanas.
Este acordo entre as autoridades portuguesas no Leste e a UNITA era apoiado pelo Governo geral e pelo comandante-chefe em Angola, assim como pelo Governo em Lisboa. No entanto, quando o general Bettencourt Rodrigues e a equipa de oficiais do Estado-Maior da ZML foram rendidos pelo general Barroso Hipólito, recomeçaram as acções militares entre as forças portuguesas e a UNITA e as acções de propaganda contra os dirigentes deste movimento junto das populações, acusando-os de enganarem o povo, prometendo a paz e trazendo de novo a guerra.
Esta reviravolta na estratégia para o Leste feita pelo substituto de Bettencourt Rodrigues revela que Barroso Hipólito não se conformava com a situação criada e preferia a linha de Kaúlza de Arriaga de “busca e destruição” e de centrar a procura de soluções na acção militar.
Em Janeiro de 1974, o novo comando da ZML lançou a Operação Castor para aniquilar a UNITA nos seus locais de refúgio e esta acção, em vez da pretendida aniquilação, fez com que a UNITA ripostasse militarmente e surgisse em Abril de 1974 como um movimento de libertação a lutar activamente contra as forças portuguesas.
A vitória militar no Leste
A alteração de atitude das autoridades portuguesas relativamente à UNITA após a substituição do general Bettencourt Rodrigues pelo general Hipólito é um revelador das contradições da condução da guerra por parte do poder político e das altas chefias militares.
Embora a doutrina de contra-subversão aceite generalizadamente nas Forças Armadas Portuguesas fosse a de considerar a manobra contra-subversiva como eminentemente política, económica e social e que à componente militar competia assegurar as condições para ela se desenrolar em segurança, existiu sempre um pequeno núcleo de oficiais adeptos da vitória militar prévia. Barroso Hipólito pertencia a este grupo, que vinha perdendo influência desde o início da guerra e, principalmente, após os maus resultados da Operação Nó Górdio, comandada por Kaúlza de Arriaga, o chefe de fila desta facção.
Ao chegar ao Leste, Barroso Hipólito fez uma análise da situação e concluiu que o ELNA e o MPLA estavam praticamente inactivos nas suas bases de retaguarda na Zâmbia e no Congo e que só a UNITA mantinha guerrilheiros em território angolano. Quanto à população, 78% estava reunida em 396 aldeamentos e reagrupamentos. A vitória militar estava à sua disposição, bastando atacar agora a UNITA. Foi o que fez.
Carta da Conferência Episcopal de Moçambique ao governador-geral denunciando os massacres de Wiriyamu.
A carta é assinada por D. Francisco Nunes Teixeira, bispo de Quelimane.
“Tendo chegado ao nosso conhecimento pormenores que se vão divulgando sobre acontecimentos que ocorreram no regulado de Gandali, não longe da cidade de Tete, em Dezembro último, nos quais centenas de pessoas, algumas delas absolutamente inocentes, teriam perdido a vida, por acção das Forças Armadas, indagámos junto do senhor Bispo de Tete sobre o que haveria de verdade em relação aos actos e às circunstâncias que os acompanharam.
(…) Diante de ocorrências desta natureza, quer elas sejam praticadas pelas Forças Armadas, quer por elementos da FRELIMO, ou por quaisquer outros, não podemos deixar de manifestar a nossa mais viva indignação e o nosso mais veemente protesto (…). Esperamos, portanto, que do apuramento da verdade e das responsabilidades, resulte maior confiança (…)”.
Resposta do governador-geral de Moçambique à Conferência Episcopal informando que decorria um inquérito sobre os acontecimentos de Wiriyamu.
A 3 de Abril o governador-geral, Pimentel dos Santos, respondeu garantindo que eram terminantes as ordens do Governo central, do Governo geral e do Comando-Chefe das Forças Armadas no sentido de evitar o máximo possível baixas, sofrimentos e prejuízos às populações. Infelizmente nas áreas onde os terroristas se encontram disseminados podia ocorrer um ou outro incidente.
Informava ainda já estar em curso um inquérito do qual daria conhecimento aos bispos.
O congresso decorreu de 4 a 8 de Abril, sob a presidência de Ruy Luís Gomes.
A Oposição realizou o seu congresso, que deixou de se chamar Republicano e passou a Democrático, dado estar aberto a todos os oposicionistas, incluindo os monárquicos.
Os objectivos reflectidos na declaração final foram o fim da Guerra Colonial, a luta contra o poder absoluto do capital monopolista, e a reconquista das liberdades democráticas.
Foi aprovada uma moção contra os crimes da Guerra Colonial e feito um minuto de silêncio de protesto pelos assassínios de Eduardo Mondlane e Amílcar Cabral. O slogan “Fim à Guerra Colonial” foi o mais gritado, mas nos bastidores aquilo que se debateu foi a “unidade das forças democráticas”, um tema caro ao PCP.
Pedir o fim da Guerra Colonial era justo e popular, mas não existia entre os oposicionistas a noção clara do que esse fim implicava.
A Oposição alheada da guerra
O congresso decorreu pouco antes do início do chamado inferno dos três G na Guiné, quando o PAIGC realizou a grande Operação Amílcar Cabral e atacou Guidage, Guileje e Gadamael, obrigando as forças portuguesas a retirar de Guileje e causando neste mês de 15 de Maio a 15 de Junho mais de meia centena de mortos às forças portuguesas. A Oposição Democrática portuguesa, no seu todo, ou através das várias correntes que a compunham, não tinha ideia do que se passava nos teatros de operações da guerra e a guerra e as consequências do seu fim não pareciam preocupar os oposicionistas. De tal modo que, durante o período em que um movimento de libertação (PAIGC) estava a obter significativas vitórias no terreno, não tenha havido contactos entre a Oposição exilada pelas capitais da Europa e de África e o PAIGC.
Sinal do incómodo que a questão colonial causava no seio da Oposição e do mau relacionamento que tinha com ela, é o facto de ter sido o Partido Comunista a única organização oposicionista portuguesa a estar presente nas cerimónias da independência da Guiné que o PAIGC levou a efeito na região de Madina do Boé.
Os oposicionistas portugueses também não procuraram aproximar-se dos militares e, no Verão de 1973, quando do seu regresso a Portugal, foi o general Spínola que tomou a iniciativa de falar com alguns conhecidos oposicionistas ligados ao Partido Socialista e com elementos do regime que se encontravam em ruptura, como era o caso da chamada Ala Liberal, sem que o assunto da guerra os tenha feito sair da sua apatia de conversas em círculo e de desconfianças mútuas.
Dois oficiais em comissão na Guiné apresentam a situação da Guiné a destacados membros da Oposição
Também no Verão de 1973, em meados de Julho, dois oficiais em comissão na Guiné, um do Quadro Permanente e outro miliciano e com estreitas ligações aos meios da Oposição, vieram a Lisboa e promoveram uma reunião no escritório do advogado Borges Coutinho com destacados elementos da Oposição para lhes expor a situação de derrota iminente na Guiné. A explicação foi registada com alguma displicência, sendo garantido que, caso os militares fizessem um golpe para derrubar o regime, teriam os melhores técnicos para assegurarem o Governo que se seguisse…
Parecer do chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, general Costa Gomes, sobre a “Convenção Internacional sobre o Estatuto de Forças Visitantes” já aprovada pelas comissões da “aliança” Alcora, entre Portugal, a África do Sul e a Rodésia.
O parecer expressava a seguinte recomendação: “Em todos os trabalhos a realizar no âmbito do Exercício Alcora parece-me que as delegações portuguesas, a todos os níveis, deverão ter sempre presente que não podemos embrenhar-nos em sectores que possam comprometer a nossa liberdade de acção política.
Compreendo que, por vezes, as nossas delegações tenham dificuldade em obstar a que se tratem determinados assuntos que, ultrapassando o âmbito militar, como o presente, se situem nitidamente no campo político.
Julgo que neste caso, deverão empalhar a discussão não tomando qualquer compromisso firme, sem previamente pedirem instruções sobre os problemas postos”.
E porque a “convenção” tinha sido decalcada de um documento NATO, o parecer recomendava:
“Não me parece curial que as nossas delegações tomem, como base dos seus trabalhos, os documentos NATO, como no caso presente”. E isto porque, acrescenta-se, “a nossa doutrina sobre variadíssimos assuntos está moldada ou segue normas de procedimento acordadas no âmbito da NATO, mas que se nacionalizaram quando foram promulgadas sem reservas pelas nossas Forças Armadas”.
Atentados das BR no Porto, contra instalações militares.
O ataque foi efectuado contra o Distrito de Recrutamento e Mobilização do Porto, que se situava numa das alas do edifício do Governo Civil e da PSP e ainda do Movimento Nacional Feminino.
Também foram destruídas instalações do Quartel-General do Porto, na Praça da República.
O avião transportava o major comandante do COP 3 e foi abatido junto a Talicó, no Norte. Na mesma região e na mesma semana tinha sido abatido um avião T-6.
Hipótese de suspensão dos voos da TAP para Bissau.
Após o abate de aviões da Força Aérea por mísseis Strela, a Força Aérea levantou a hipótese de suspender as operações de aterragem e descolagem dos Boeing da TAP no aeroporto de Bissau.
Esta hipótese provocou alarme no território a que o governador, general Spínola, respondeu garantindo aos ministros da Defesa e do Ultramar não haver justificação para suspender o tráfego aéreo e que o Governo da Guiné-Bissau garantia a segurança no raio de acção de aterragem e descolagem do aeroporto de Bissau.
Foram para o efeito lançados campos de minas entre Nhacra e Mansoa e reforçada a segurança.
Discurso de Marcelo Caetano, de resposta às conclusões do Congresso da Oposição Democrática.
São de realçar as seguintes palavras: “Lanço o alerta: cada vez mais se define claramente a opção oferecida aos portugueses. Não se iludam, têm de escolher entre um regime de verdadeira e sã democracia, como o nosso, e a opressão comunista…
Nem faltam respeitáveis burgueses e não menos respeitáveis senhoras burguesas que, com a mesma leviandade dos nobres da corte de Maria Antonieta, fazem gala em mostrar a sua abertura de espírito ao concederem, nas conversas de salão, a sua simpatia ao sistema que, a ser posto em prática, se apressaria a dar conta delas…”.
Mensagem de Kaúlza de Arriaga a contrariar a formação de Flechas da DGS em Moçambique.
Dizia o comandante-chefe de Moçambique: “Parece em estudo a formação e emprego de Flechas em Moçambique. Considero tal desnecessário e mesmo inconveniente face à existência de excelentes GE e GEP e situação da DGS. Os Flechas, diga-se o que se disser, não são fontes de informação mas forças combatentes e não podem agir melhor que os GE e GEP. Julgo-os assim desnecessários devendo com vantagem serem substituídos por mais GE e GEP”.
Deflagração pelas BR de três engenhos explosivos de fraca potência no Porto, em Sacavém e Vila Franca de Xira, com distribuição de panfletos clandestinos.
Directiva 15/73 de Spínola sobre a “Actualização e Evolução da Força Africana”.
Nos considerandos Spínola verificava que “a crescente adesão das populações à política de promoção sócio-económica tem-nos permitido desenvolver progressivamente a “Força Africana”, a qual, por sua vez tem contribuído para acentuar o desequilíbrio psicológico dos naturais da Guiné a nosso favor, além de nela assentar a estrutura da defesa militar da Província.
Desta forma, a participação da “Força Africana” na luta confere foros de autenticidade à ideia-força de uma “Guiné Portuguesa defendida e administrada por Guinéus”. (…)
Assim, e a fim de assegurar a necessária continuidade de pensamento e acção em matéria de tão fundamental importância, definem-se as linhas de orientação da previsível evolução da Força Africana:
“Batalhão de Comandos da Guiné”
Unidade típica de intervenção a nível de Comando-Chefe, composta por companhias totalmente africanizadas e possuindo uma estrutura europeia de enquadramento a nível de Estado-Maior/Batalhão e Administração-Logística. Deve prever e preparar progressivamente uma africanização total no campo operacional e no campo administrativo-logístico”.
“Companhias de Caçadores Africanos”
Forças, em princípio, de constituição regionalista e étnica, actualmente com enquadramento europeu. De prever e preparar a africanização de Sargentos e Cabos dentro de 1 ano; de Oficiais subalternos dentro de 2/3 anos, em ordem a obter-se a africanização total destas unidades”.
“Corpo de Milícias”
Força militarizada constituída com a dupla finalidade de força combatente para defesa do seu “chão” e de elemento de trabalho agrícola, para valorização do mesmo. É uma força regionalista e étnica, com enquadramento nativo (africanização total) e caracterizada pela grande autonomia de acção”.
Grande ataque da aviação portuguesa a bases do PAIGC na Guiné-Conacri.
Um relatório da DGS de 25 de Abril referia um ataque de grande envergadura da Força Aérea Portuguesa a bases do PAIGC na Guiné-Conacri: “Princípios Abril FAP bombardeou sua máxima força, seis Fiat, base do PAIGC Kambera, República da Guiné e sul de Madina do Boé. Muitas casas destruídas e outras queimadas, muitos terroristas mortos, armas antiaéreas ficaram inutilizadas.
Terroristas refugiaram-se acampamentos situados entre Kambera e Boulhel”. O relatório da DGS prossegue com o seguinte comentário:
“Esta acção foi retaliação abate avião tenente-coronel Brito. Convém VEXA saiba que na Província há somente seis pilotos Fiat, incluindo coronel Moura Pinto (comandante da Zona Aérea da Guiné e Cabo Verde), que voam todos os dias”.
Conjunto de acções de protesto contra o regime no dia 1 de Maio.
No dia 1 de Maio e na véspera ocorreram acções de protesto organizadas pelas BR em várias localidades. Algumas assumiram formas violentas.
Atentado das BR contra o Ministério das Corporações e Previdência Social com explosivos, que destruiu os 4º e 5º andares do edifício.
Deflagração de engenhos explosivos que espalharam panfletos em locais públicos centrais em Águeda, Vila Franca de Xira, Moita, Baixa da Banheira, Seixal, Cacilhas, Cova da Piedade, Grândola, Vila Real de Santo António, Olhão, Portimão, Setúbal, Porto, Lisboa, Coimbra, Guimarães, Tavira e Oliveira de Azeméis.
Manifestações de protesto reprimidas pela polícia no Rossio em Lisboa, de que resultaram 12 feridos e na Rotunda da Boavista, no Porto.
A DGS atribuiu estas acções a estudantes activistas dos movimentos académicos das escolas superiores e “agora nos liceus”.
Informação do chefe do Estado-Maior General, Francisco da Costa Gomes, sobre a situação em Moçambique.
Refere a informação, enviada ao ministro da Defesa:
“1. Na grande área de Tete – Vila Gouveia – Manica – Vila Pery – Gorongosa – Vila Fontes – Morrumbala – Tete, as medidas contra-subversivas de responsabilidade civil não se realizaram com tempo e intensidade, facilitando ao IN a conquista psicológica do meio humano.
2. As medidas militares concebidas pelo comandante-chefe consideram-se acertadas, parece, no entanto, que a iniciativa continuou a pertencer ao inimigo, pois que estas medidas são já consequência de acções armadas adversas (atraso de um tempo na manobra militar) (…)”
Directiva do ministro do Ultramar sobre a operação de salvamento e encaminhamento de fauna durante o enchimento da barragem de Cahora Bassa – Operação Arca de Noé.
Dizia a directiva: “Em condições normais da situação das populações na zona da albufeira e nas áreas confinantes, as medidas em curso e em preparação para se realizar com êxito a Operação Arca de Noé levariam a fazer toda uma campanha prévia de chamada de atenção mundial para a ela chamar jornalistas, cientistas e cineastas de todas as origens que a pudessem presenciar livremente.
Nas condições actuais afigura-se preferível ir prestando as informações com a conveniente prudência e só permitir que a operação seja presenciada por individualidades de isenção reconhecida e em áreas limitadas pré-definidas, nas quais as FA possam garantir a conveniente segurança. (…)
É sabido que em certas áreas da zona da albufeira não foi até hoje possível proceder-se ao reordenamento das populações e não é garantido, pelo menos até ao momento, que tal reordenamento venha a conseguir-se em condições de voluntariedade nessas áreas.
Não é, também, impossível que actividades preparadas com antecedência pelos movimentos terroristas que actuam (principalmente na margem norte do rio Zambeze) nas áreas afectas à albufeira e ao reordenamento das populações, possam lançar certa perturbação na parte humana desses casos difíceis e patentear afogamentos por elas provocadas (…)”.
O Plano Base para salvamento e transferência da fauna bravia da albufeira de Cahora Bassa foi dirigido por K.L. Tinley, um ecólogo ao serviço da Direcção dos Serviços de Veterinária de Moçambique.
Início do Congresso da Acção Nacional Popular (ANP), em Tomar.
O congresso foi presidido por Elmano Alves e centrou-se na defesa da política ultramarina do Governo.
Silva Cunha, ministro do Ultramar, reafirmou os princípios do Governo de unidade política, autonomia das regiões e enviou um recado a Spínola que havia proposto negociações com o PAIGC:
“Aqui estamos para proclamar que não aceitamos teses derrotistas de abandono, que repudiamos propósitos de entendimento que constituem verdadeira traição, que continuaremos no Ultramar sem ceder, sem transigir, sem capitular na luta que lá se trava…”
Reunião de comandos militares em Bissau para apreciação da situação militar, declarando Spínola que as implicações da carência de meios para enfrentar a ofensiva do PAIGC conduziam a opções que ultrapassavam a sua esfera de responsabilidade.
O Comando-Chefe das Forças Armadas na Guiné fazia a seguinte avaliação das possibilidades do inimigo:
Intensificar a acção antiaérea, em ordem a retirar-nos a liberdade de acção no ar;
Incrementar a acção da guerrilha em ataques a aquartelamentos e emboscadas a colunas;
Massificar as acções contra as povoações com guarnição militar, em ordem a obter sucessos politicamente exploráveis.
Esta actividade incidirá nas guarnições de fronteira, em especial as acções com carros de combate;
Num futuro próximo prevê-se que o inimigo:
Intensifique a resistência à reocupação do Sul (Cantanhez);
Incremente a sua actividade contra meios navais;
Tente a eliminação sistemática de guarnições mais expostas sobre a fronteira;
Estabeleça no Boé a fisionomia de um novo Estado, a proclamar;
Consolide as bases de uma ulterior evolução do conflito para a fase convencional, com directo empenhamento externo.”
Spínola resumiria esta análise do seguinte modo: “Afiguram-se-nos manifestamente insuficientes os meios actuais face à evolução verificada, pois considero demonstrada à evidência a impossibilidade de alterar a manobra para economizar meios sem grave prejuízo da missão.
Esta situação de insuficiência agudiza-se ainda pelas perspectivas de intervenção externa na Guiné”.
Início do ataque do PAIGC ao quartel de Guidage, no Norte da Guiné.
A 8 de Maio, o PAIGC lançou uma ofensiva concentrada de envergadura contra Guidage, unidade situada mesmo junto à linha de fronteira com o Senegal, fazendo parte de uma quadrícula militar de vários agrupamentos a norte do rio Cacheu que ia, a oeste, até Barro, sob um comando operacional (COP 3) com sede em Bijene. Para garantir a defesa de Guidage, o Comando-Chefe da Guiné teve que enviar para a zona um conjunto elevado de unidades e tropas especiais, Comandos, Páraquedistas e Fuzileiros, bem como unidades de Artilharia e mesmo de Cavalaria. A guarnição local, quando começou o cerco, era constituída por uma companhia de Caçadores e por um pelotão de Artilharia, equipado com obuses de 10,5mm num total de 200 homens, a maioria do recrutamento local.
Na operação de auxílio, reabastecimento e contra-ofensiva, que durou de 8 de Maio a 8 de Junho de 1973, estiveram envolvidos mais de mil homens (na maioria tropas especiais) das Forças Armadas Portuguesas.
As forças portuguesas sofreram 39 mortos e 122 feridos. Pelo menos seis viaturas militares de vários tipos foram destruídas e foram abatidos três aviões, um T-6 e dois DO-27.
Só a guarnição de Guidage contabilizou sete mortos e 30 feridos. Nos cerca de 20 dias que ficou cercada esteve sujeita a 43 ataques com foguetões de 122mm, artilharia e morteiros. Todos os edifícios do quartel foram danificados.
A unidade que, no conjunto, teve mais mortos foi o Batalhão deComandos, 10 no total. Sofreu ainda 22 feridos, quase todos graves, e três desaparecidos.
O isolamento de Guidage iniciou-se com o abate de um avião T-6, dois DO-27 e o cerco terrestre acentuou-se em 8 de Maio quando uma coluna que partiu de Farim accionou uma mina e foi emboscada, sofrendo 12 feridos. Foi obrigada a regressar à base de partida.
A 9 de Maio a mesma força foi de novo emboscada, mantendo-se em combate por quatro horas e sofrendo quatro mortos, oito feridos graves, 10 feridos ligeiros e quatro viaturas destruídas. A coluna dirigiu-se para Binta em vez de seguir para Guidage. Na manhã seguinte, a Força Aérea destruiu o que restava destas quatro viaturas e material.
A 10 de Maio, no deslocamento Binta/Guidage, as unidades envolvidas, sob o comando do comandante do Batalhão de Farim, sofreram um morto e dois feridos, encontrando a picada cortada por abatises. Uma coluna que tinha saído de Guidage (CCaç 19) para proteger o itinerário sofreu cinco emboscadas, de que resultaram oito mortos e nove feridos.
Devido à situação crítica, o comandante do COP 3, tenente-coronel Correia Campos, deslocou-se para Guidage onde se manteve até 11 de Junho. A 12 de Maio chegou a Guidage uma coluna de reabastecimento constituída pelos Destacamentos de Fuzileiros 3 e 4.
A 15 de Maio, no regresso dos Fuzileiros a Farim, as forças portuguesas accionaram duas minas sofrendo dois feridos graves e uma emboscada entre Binta e Guidage de que resultaram cinco feridos. Uma coluna que entretanto saiu de Binta conseguiu chegar a Guidage no mesmo dia. O PAIGC ameaçava isolar completamente Guidage, dados os campos de minas lançados, as emboscadas montadas e a impossibilidade dos meios aéreos actuarem, devido ao dispositivo antiaéreo montado com os mísseis Strela.
Kaúlza de Arriaga aceita finalmente a constituição de grupos de Flechas e resigna-se em mensagem para o ministro da Defesa.
“Apesar da minha mensagem está a proceder-se à formação de Flechas em Moçambique. Parece que tenho de aceitar o facto, contudo não permitirei que em certas áreas os Flechas actuem fora do comando operacional militar…”.
Efectivamente, os Flechas começaram por actuar no Niassa, uma área não prioritária.
Na reunião de 8 e 9 de Maio do Conselho de Defesa de Moçambique, Kaúlza ouviu da boca do governador-geral, Pimentel dos Santos, que a criação dos Flechas em Moçambique era uma decisão do Governo central.
Esta decisão do Governo de Lisboa revelava a crescente desconfiança na eficácia da acção de comando de Kaúlza e nos seus métodos.
Informação do Estado-Maior General sobre a utilização de napalm e outras armas incendiárias.
A informação começa por enquadrar o assunto, procurando justificar e minimizar os efeitos da sua utilização, se forem usados critérios muito restritivos.
Relativamente à sua utilização concreta, a informação refere a sua interdição em Angola, dada a sua pouca eficácia, admitindo apenas situações muito excepcionais. Em relação à Guiné, a informação admite que se tem feito uso destes meios, mas procurando que não sejam atingidas populações. Em Moçambique, igualmente a sua utilização era muito restritiva. Em relação a quantidades, a informação avança com os seguintes números de utilização mensal: na Guiné cerca de 100 bombas e 300 granadas incendiárias e em Moçambique cerca de 60 bombas e 30 granadas.
Reunião de comandos militares em Bissau, para apreciação da situação militar.
Durante esta reunião, e na posse de notícias preocupantes sobre a actividade militar do PAIGC, principalmente a que se desenvolvia sobre Guidage, Spínola declarou: “Encontramo-nos indiscutivelmente na entrada de um novo patamar da guerra, o que necessariamente impõe o reequacionamento do trinómio missão-inimigo-meios”. Referiu também que as implicações da carência de meios para enfrentar a ofensiva do PAIGC conduziam a opções que ultrapassavam a sua esfera de responsabilidade.
A FRELIMO atacou Mueda com foguetões de 122mm e morteiros a partir de posições a sul da estrada para Miteda. As explosões ocorreram ao fundo da pista e os vestígios deixados pelos atacantes indicavam que pertenciam à base Gungunhana, para onde retiraram.
Início da Operação Ametista Real, em que o Batalhão de Comandos da Guiné assalta a base de Cumbamori, do PAIGC, situada em território do Senegal.
A operação destinava-se a aliviar o cerco do PAIGC a Guidage e a permitir o reabastecimento daquela guarnição.
Só a destruição da base de Cumbamori, a grande base do PAIGC no Senegal, na península do Casamança, permitiria pôr fim ao cerco a Guidage. A operação era difícil e de resultados imprevisíveis. O ataque ao Senegal foi atribuído ao Batalhão de Comandos Africanos, comandado pelo major Almeida Bruno – que tinha por hábito atribuir às acções militares o nome de pedras preciosas: esta ficou Operação Ametista Real.
Na tarde de 19 de Maio de 1973, uma sexta-feira, 450 homens do Batalhão de Comandos Africanos embarcaram em lanchas da Marinha e subiram o rio Cacheu até Bigene, onde chegaram ao pôr-do-sol. À meia-noite a força de ataque seguiu dividida em três grupos de combate – o Agrupamento Bombox, comandado pelo capitão Matos Gomes, o Agrupamento Centauro, sob o comando do capitão Raul Folques, e o Agrupamento Romeu, comandado pelo capitão Pára-quedista António Ramos.
O comandante da operação, Almeida Bruno, seguiu integrado no Agrupamento Romeu, que levava um grupo especial comandado por Marcelino da Mata. Avançaram durante a madrugada e pisaram território senegalês cerca das seis da manhã do dia 20, sábado. Às oito horas, uma esquadrilha de aviões Fiat iniciou pesado bombardeamento da zona. Os pilotos atacaram um pouco às cegas, porque a exacta localização da base da guerrilha não era conhecida. Mas por sorte as bombas da aviação acertaram em cheio nos paióis. Mal cessou o ataque aéreo, que não terá demorado mais do que dez minutos, os grupos comandados por Matos Gomes e Raul Folques lançaram-se no assalto, enquanto o Agrupamento Romeu, comandado por António Ramos e onde seguia o comandante da operação, Almeida Bruno, tomava posição como força de reserva. Os três agrupamentos envolveram-se em duros combates: “Os soldados de ambos os lados estavam tão próximos uns dos outros que era impossível delimitar uma frente”. O combate foi corpo a corpo e desenrolou-se até às 14h10, quando Almeida Bruno dá ordem para o Agrupamento Centauro apoiar uma ruptura de contacto entre as forças do Batalhão de Comandos e as do PAIGC. O Agrupamento Bombox estava praticamente sem munições e o Agrupamento Centauro substituiu-o no contacto. Entretanto, Raul Folques, o comandante do Agrupamento, apesar de gravemente ferido numa perna, conseguiu a ruptura do combate. A marcha do Batalhão de Comandos em direcção a Guidage foi lenta e com várias emboscadas pelo meio.
Resultados
Pelas 16 horas cessaram os combates e às 18h20 os primeiros homens do Batalhão de Comandos começaram a chegar a Guidage.
Tinham sido destruídos:
22 depósitos de material de guerra;
Duas metralhadoras antiaéreas;
50 mil munições de armas ligeiras;
300 espingardas Kalashnikov;
112 pistolas PPsH;
560 granadas de mão;
400 minas antipessoal;
100 morteiros 60;
11 morteiros 82;
1100 granadas de morteiro 82;
138 RPG7;
450 RPG2;
21 rampas de foguetes 122.
O PAIGC sofreu 67 mortos, entre os quais uma médica e um cirurgião cubanos e quatro elementos mauritanos, enquanto os Comandos sofreram dez mortos, dos quais dois oficiais, 23 feridos graves (três oficiais e sete sargentos) e três desaparecidos.
Uma nova coluna de reabastecimentos ficou retida em Farim, por ter sido atacada uma coluna entre Mansoa e Farim de que resultou a destruição de três viaturas que ficaram no terreno, tendo as forças portuguesas sofrido quatro mortos e 16 feridos, dos quais nove graves.
Na luta por Guidage, o PAIGC utilizou a sua Infantaria apoiada por artilharia pesada e ligeira, além de um grupo especial de mísseis terra-ar. Em armamento utilizou foguetões de 122mm, morteiro de 120 e 82mm, canhões sem recuo de 5,7 e 7,5cm, RPG 2, RPG7, armamento ligeiro e mísseis Strela.
Início da Operação Amílcar Cabral realizada por forças do PAIGC contra o quartel de Guileje no Sul da Guiné. Este ataque foi conjugado com o ataque a Guidage, pretendendo o PAIGC isolar as guarnições de fronteira.
A 18 de Maio, na zona Sul, junto à fronteira com a Guiné-Conacri, as unidades do PAIGC concentraram as suas forças de Infantaria e de Artilharia ao redor de Guileje, preparando um ataque de grande envergadura, que apontava para uma tentativa de tomada do quartel. Durante a execução de uma coluna de reabastecimento, as forças de Guileje foram fortemente emboscadas por duas vezes, a cerca de dois quilómetros do quartel, tendo sofrido um morto (comandante do pelotão de milícias de Guileje), sete feridos graves (cinco milícias de Guileje) e quatro feridos ligeiros. Por falta de evacuação aérea, um dos feridos graves (soldado metropolitano) faleceu quatro horas depois da emboscada.
A falta de evacuação aérea resultava das grandes limitações impostas pelo aparecimento dos mísseis antiaéreos Strela, que impuseram fortes restrições ao apoio aéreo na região de Guileje e Gadamael.
O comandante do COP 5, major Coutinho e Lima, enviou mensagens a alertar para a gravidade da situação. Informou que a não satisfação do pedido de apoio de fogos, bem como a não execução das evacuações “tinha causado mal-estar no pessoal”.
Às 20 horas do dia 18, o PAIGC iniciou as flagelações a Guileje e às 2h20 o COP 5 solicitou apoio urgente, pois estava debaixo de fogo contínuo. Foi-lhe respondido que seria efectuado o apoio aéreo logo que possível e o major Coutinho e Lima pediu para expor directamente o assunto ao general Spínola. Reticente, este aceitou recebê-lo em Bissau, mas ao fim da tarde do dia 20 mandou-o regressar ao COP 5.
Às 14h15 do dia 21 foi recebida, em Gadamael, a última mensagem de Guileje: “Estamos cercados de todos os lados”. Seguiu-se o silenciamento das comunicações de/e com o quartel.
Retirada da guarnição portuguesa do quartel de Guileje, no Sul da Guiné, para Gadamael-Porto, depois de cinco dias de contínua flagelação pelo PAIGC, que ocupou a base.
Às 5h30 do dia 22, Guileje foi evacuada, tendo os militares seguido a pé para Gadamael, deixando para trás as viaturas e o armamento pesado, destruídos ou inutilizados. No dia 22, uma mensagem-relâmpago dirigida à Companhia 4734 em Gadamael mandava informar o comandante do CAOP 3, coronel Ferreira Durão, que o general comandante-chefe tinha determinado que fosse retirado imediatamente o comando do COP 5 ao major de Artilharia Coutinho e Lima e mandado apresentar no Quartel-General em Bissau, para efeito de auto de corpo de delito.
Telegrama de Spínola para o ministro da Defesa a relatar a situação de Guileje, no Sul da Guiné.
É o seguinte o texto do telegrama:
“Conforme seu pedido telefónico informo que sob pressão IN comandante local mandou evacuar Guileje e destruir aquartelamento sem ordem deste comando.
Trata-se lamentável estado de pânico perante manifesta superioridade inimigo o que em caso algum justifica tal decisão.
Esclareço Guileje estava sem comunicações Bissau virtude destruição antena pelo inimigo. Mandei levantar auto corpo de delito comandante responsável. Insisto pedido reforços”.
Notícia da DGS referindo que o PAIGC tinha em Simbeli (Guiné-Conacri) viaturas blindadas para serem utilizadas contra Guileje, Gadamael e Bedanda. Algumas destas viaturas foram mais tarde referenciadas em Bedanda.
Notícia proveniente do posto da DGS de Bissorã (Guiné) informando que o capitão do Exército cubano Aldrigo da Silva, comandante dos cubanos integrados nas unidades do PAIGC no Norte da Guiné, determinara a reunião de todos os seus homens no acampamento de Canjabari a fim de seguirem para a base de Hermacono no Senegal.
Um grupo de 20 militares cubanos que se preparava para atacar uma coluna portuguesa na estrada Guidage-Binta tinha sofrido 15 mortos num ataque da Força Aérea Portuguesa. Além dos cubanos a combater pelo PAIGC, a DGS confirmava ainda a existência de combatentes do Mali comandados por um militar que a DGS identificou como Buaró.
Início de uma visita de Costa Gomes, chefe de Estado-Maior General, à Guiné.
Informado da grave situação que se vivia na Guiné, Costa Gomes deslocou-se ao território, onde acompanhou a última fase das operações e analisou as medidas a tomar para garantir a manutenção de uma capacidade militar mínima para garantir o exercício da acção do Governo.
Suspensão dos trabalhos de construção da linha de transporte de energia eléctrica da barragem de Cahora Bassa, pela empresa italiana concessionária, alegando falta de segurança.
A empresa só aceitava retomar os trabalhos se a protecção fosse efectuada por unidades de Comandos ou outras equivalentes.
Kaúlza de Arriaga propôs ao ministro da Defesa que fossem transferidas de Angola para Moçambique duas companhias de Comandos de Angola.
Relatório sobre a utilização de napalm e outras armas incendiárias.
A propósito da discussão dos projectos de protocolos adicionais à Convenção de Genebra, elaborados pela Comissão da Cruz Vermelha, o secretário-adjunto da Defesa Nacional apresentou um relatório sobre a utilização de “napalm e outras armas incendiárias” pelas Forças Armadas Portuguesas.
Este documento destinava-se a servir de apoio à posição do delegado português, e dizia o seguinte:
“Angola
Excepcionalmente, em situações de intervenção o napalm é utilizado muito limitadamente, na medida em que é muito pouco eficaz em relação aos objectivos existentes no teatro de operações.
Guiné
É neste teatro de operações que, tacticamente, mais se carece da utilização de meios incendiários.
Há ordens rigorosas para redução ao mínimo a sua utilização, a fim de evitar que elementos da população sejam afectados.
Memorando do secretário de Estado da Aeronáutica, Pereira do Nascimento, enviado ao ministro da Defesa, acerca das necessidades de equipamentos para que a Força Aérea tivesse capacidade para enfrentar as novas ameaças que surgiam nos teatros de operações.
Neste estudo dizia-se que “o inimigo podia intervir esporadicamente com aviões isolados ou parelhas para exercer pressão ou interferir no controlo de áreas nacionais, dependendo dos países fornecedores dos meios aéreos. (…)
Quanto às armas antiaéreas do inimigo, a liberdade de acção das forças aéreas tem sido conseguida por ausência de inimigo aéreo e por uma antiaérea fraca. Mas a arma aparecida na Guiné a partir dos fins de Março (Strela) surpreendeu aviões em voo causando baixas sensíveis e provocando restrições importantes à liberdade de voo. (…)
Uma conclusão se impõe desde já:
a necessidade de acelerar o mais possível a aquisição de caças modernos, capazes de ataques ao solo com precisão e fora do alcance do míssil, dado que os Fiat G-91 não têm as características suficientes”.
A frota da Força Aérea era constituída, em 1973, por 669 aeronaves de 25 tipos diferentes.
Apenas 202 aeronaves tinham idade inferior a 10 anos (28%); 72% das aeronaves eram de fabrico antigo e 51% eram pequenos aviões monomotores de hélice. Era uma frota que apresentava inseguranças adicionais ao risco normal, de voo lento, só utilizável sem inimigo aéreo ou com reacção antiaérea muito fraca.
Para colmatar estas deficiências a Força Aérea propunha a aquisição de:
60 helicópteros AL III – 600 000 contos (Existiam 102);
Um helicóptero SA 330 Puma (para substituir o destruído no atentado de Tancos – 28 000 contos) (existiam 11) e, em 2ª prioridade, mais 12;
27 Mirage V monolugares e três bilugares (3 000 000 contos);
50 aviões de transporte ligeiros (Aviocar ou Skyvan – 1 000 000 contos);
120 aviões de reconhecimento e fogo ligeiros (Cessna FTB337-G ou OV-10) ao preço unitário estimado de 6500 contos por unidade (780 000 contos);
Três radares móveis de campanha (150 000 contos).
A análise dos aviões de caça contemplou as seguintes aeronaves:
EUA
F-104G (Lockheed)
Phanton II – F-4C (McDonnel Douglas)
F-5A (Northrop)
França
Mirage III (Dassault)
Mirage V (Dassault)
Mirage F1 (Dassault)
Suécia
Saab J35
Do estudo comparativo foram seleccionados os seguintes:
Mirage V
F-5A
F-4C
A Força Aérea considerava muito difícil obter aviões americanos, por razões políticas e os aviões Mirage não foram adquiridos.
Agravamento da situação em Gadamael-Porto, em consequência da pressão militar do PAIGC e da retirada da guarnição de Guileje.
Durante o mês de Maio o PAIGC realizou 220 acções militares de sua iniciativa, atingindo o valor mais elevado desde o início da guerra.
Após a retirada das tropas portuguesas de Guileje para Gadamael, este quartel ficou com um dispositivo de duas companhias (Caçadores 4743 e Cavalaria 8350) e ainda dois pelotões da Companhia de Caçadores 3520, um pelotão de canhões sem recuo com cinco armas, um pelotão de reconhecimento, com apenas um veículo blindado White, mais um pelotão de Artilharia com cinco obuses de 14cm e um pelotão de milícias. Um outro pelotão de milícias estava reduzido a uma secção.
Depois do afastamento do major Coutinho e Lima, assumiu o comando do COP 5 o capitão Ferreira da Silva, dos Comandos.
Gadamael, entre o meio-dia de 31 de Maio e o fim da tarde de 2 de Junho, esteve debaixo de fogo de armas pesadas e ligeiras continuadamente, tendo sido referenciados disparos de morteiros de 120mm, canhões sem recuo e lança-granadas foguete, com um número de rebentamentos estimado de 700, que causaram cinco mortos e 14 feridos e elevados prejuízos materiais.
No dia 1 de Junho, a Companhia de Caçadores 3520, de Cacine, transmitiu a seguinte mensagem para Bissau:
“Informo Gadamael Porto destruído. Feridos e mortos confirmados. Pessoal daquele fugiu para o mato. Solicito providências e instruções concretas acerca procedimento desta”.
O Comando-Chefe determinou que as tropas Pára-quedistas, que se encontravam em Cufar, seguissem para Gadamael.
Durante o mês de Maio de 1973 as forças portuguesas na Guiné sofreram 63 mortos, 269 feridos e um prisioneiro, tendo o PAIGC realizado 166 ataques a posições militares portuguesas, 36 emboscadas, 12 ataques contra aeronaves, um contra-embarcações, e implantado 105 minas, das quais 66 foram accionadas por militares portugueses, o que dá ideia do agravamento da situação sofrida na Guiné neste período.
Carta de Sá Viana Rebelo para Kaúlza de Arriaga a anunciar o fim da sua comissão.
A certo passo, a carta referia: “(…) admitiu a possibilidade de continuar mais algum tempo se lhe fossem dados os reforços que pediu.
Tais reforços foram cuidadosamente analisados e não se encontra possibilidade de se lhes dar agora solução.
Assim, venho comunicar-lhe que a partir do fim de Julho fica liberto da missão que lhe coube em Moçambique…”.
Os reforços que Kaúlza tinha pedido constavam de uma carta de 29 de Janeiro de 1973 e incluíam um alargamento de competências para escolher os oficiais comandantes adjuntos do Exército, Marinha e Força Aérea, os chefes do Estado-Maior e o comandante das forças de intervenção, a competência para graduar oficiais e sargentos dos quadros permanentes, para autorizar despesas até 2000 contos, para dispor de uma dotação anual de 50 000 contos a aplicar de acordo com as necessidades inopinadas da guerra, a definição pelo Governo de Lisboa de uma estratégia a nível nacional que conferisse prioridade ao teatro de operações de Moçambique nos próximos dois anos, os seguintes reforços de pessoal:
Pessoal para o Centro de Instrução e Batalhão de Comandos;
Dois Batalhões de Caçadores (Vila Gouveia e Mocumbura);
18 Companhias de Caçadores;
Quadros para 12 Companhias de Comandos;
Duas Companhias de Páraquedistas;
Quadros para 17 GE.
Fornecimento de:
150 000 minas antipessoal para o obstáculo de Cahora Bassa e linhas de transporte;
1 000 000 de minas antipessoal para a fronteira do Rovuma (com a Tanzânia);
5/6 aviões Noratlas;
20 helicópteros AL III para operações gerais;
Oito helicópteros AL III para a defesa de Cahora Bassa:
Helicópteros PUMA;
Meios aéreos e navais de interdição da albufeira de Cahora Bassa.
O ofício acabava com: “Naturalmente que muitas outras necessidades existem mas que não sendo vitais não podem considerar-se como sine qua non”.
Abertura do I Congresso dos Combatentes, na cidade do Porto, que seria contestado, através de um abaixo-assinado, por cerca de 400 oficiais das Forças Armadas.
O I e único Congresso dos Combatentes do Ultramar decorreu no Porto de 1 a 3 de Junho em nome da “grandeza e unidade de Portugal” e os seus promotores apresentaram como ideia forte – “Não seremos a geração da traição”. A organização deste congresso teve como base alguns jovens, na sua maioria estudantes de Extrema-Direita, sendo que uns tinham acabado de cumprir o serviço militar em África, outros estavam mobilizados e que, tal como os seus colegas de Esquerda, pretendiam intervir no processo político português, mas tendo como objectivo a manutenção da estrutura colonial vigente. A maioria destes jovens tinham feito comissões em Angola, eram favoráveis às teorias integracionistas que consideravam estarem a ser traídas com a revisão da Constituição e com a nova Lei Orgânica do Ultramar e consideravam, pelo que tinham visto, que a guerra estava a ser vencida do ponto de vista militar. Para eles, faltava ganhar a retaguarda.
O congresso era, antes de mais, um aviso a Marcelo Caetano que, não tendo outra saída que não fosse apoiá-lo, tomou as suas cautelas para a reunião não surgir como uma manifestação extremista. Para controlar esta facção do regime envolveu os membros do Governo e promoveu, através de Sá Viana Rebelo, ministro da Defesa, a nomeação do prudente e respeitado general António Augusto dos Santos para presidente do congresso.
Ainda com a intenção de arrefecer os ânimos mais exaltados, foram os comandantes-chefes dos teatros de operações incentivados a enviarem delegações de militares, incluindo do Quadro Permanente, ao congresso.
Em Angola esteve constituída uma delegação e na Guiné, num primeiro momento, em Fevereiro/Março, no regresso de uma viagem a Lisboa, Spínola também estava disposto a enviar militares ao Porto.
O assunto do Congresso dos Combatentes tinha entretanto começado a ser discutido entre os oficiais do núcleo que daria origem ao movimento dos capitães na Guiné e que se reuniam no Agrupamento de Transmissões e no Grupo de Artilharia, sendo clara e cada vez mais ampla a oposição à participação no que aparecia aos olhos de todos como uma forma de pressão sobre o Governo para continuar a guerra.
Efectivamente, na Guiné viviam-se tempos favoráveis ao debate. Pelo seu clima, pelo seu tamanho, pela acção e propostas políticas de Spínola, pela guerra conduzida pelo PAIGC, de forma mais aberta ou mais reservada a contestação ao congresso floresceu e a reacção e repúdio dos oficiais do Quadro Permanente ao Congresso dos Combatentes do Ultramar transformou-se na primeira pedrada no charco, na Guiné-Bissau.
Em finais de Março, o grupo de oficiais mais próximos de Spínola, Almeida Bruno, Dias de Lima, Monge e outros, apercebeu-se da contestação e informou o general do descontentamento que se apoderou dos oficiais em geral. Spínola sentiu apoio para se desligar do congresso e transmitiu essa posição para Lisboa.
O grupo de oficiais “spinolistas” tomou a direcção da contestação, organizando dossiês para obter assinaturas de oficiais contra o congresso.
A Comissão Organizadora do Congresso mandou dois elementos de Lisboa a Bissau, o tenente-coronel Caçorino Dias, oficial de Cavalaria e deficiente de guerra, e o ex-alferes miliciano e monárquico Nuno Cardoso da Silva, para tentarem convencer os oficiais da Guiné da bondade do congresso e das vantagens da presença de uma delegação.
Numa longa reunião realizada na sede do Programa de Informação das Forças Armadas (PIFAS), os oficiais da Guiné expuseram a situação e a falta de sentido de defender as posições que estavam na origem do congresso. Como resultado desta discussão, Caçorino Dias demitiu-se da organização.
A movimentação com recolha de assinaturas entre os oficiais em serviço na Guiné, que veio a atingir 400, foi um excelente pretexto para os consciencializar e para os preparar para as contestações seguintes. No dia da abertura do congresso foi enviado de Bissau um telegrama assinado por Marcelino da Mata e Rebordão de Brito, os dois oficiais naturais da Guiné e condecorados com a Torre e Espada, a mais alta condecoração portuguesa e com o seguinte texto:
“Os oficiais do Q. P. em serviço no teatro de operações da Guiné não aceitam outros valores nem defendem outros interesses que não sejam os da Nação; Não reconhecem aos organizadores do I Congresso dos Combatentes do Ultramar, e portanto ao próprio Congresso, a necessária representatividade; Não participando nos trabalhos do Congresso, não admitem que pela sua não participação sejam definidas posições ou atitudes que possam ser imputadas à generalidade dos combatentes; Por todas as razões formuladas se consideram e declaram totalmente alheios às conclusões do Congresso, independentemente do seu conteúdo ou da sua expressão”.
Em Lisboa o descontentamento dos oficiais deu também origem a um movimento de contestação que foi encabeçado por Ramalho Eanes, Hugo dos Santos e Vasco Lourenço.
É curioso notar que na contestação desenvolvida na Metrópole se encontram na primeira linha oficiais que tinham feito comissões na Guiné. Na Guiné estava já criado o ambiente propício ao debate sobre a guerra, tema tabu do regime.
Num momento em que, sobretudo na Guiné, os confrontos se agravavam e o desgaste provocado pelo esforço de guerra se reflectia perigosamente no moral das tropas, aos olhos de muitos começava a ser óbvio que o Governo aceitaria mais facilmente uma derrota militar do que a cedência perante os movimentos de libertação. O espectro do caso da Índia era preocupante, temendo-se que, uma vez mais, as Forças Armadas fossem responsabilizadas pelos erros políticos do regime e pela sua estratégia colonial. A mobilização em torno da contestação ao Congresso dos Combatentes acabou por patentear um clima de mal-estar que se começava a instalar no interior das Forças Armadas e o elevado número de assinaturas reunidas em apenas alguns dias em Bissau e em Lisboa são disso um sinal incontestável.
Para camuflar o fracasso em que o congresso se transformara e para evitar expor o agravamento das fracturas no seio das Forças Armadas e do regime, Sá Viana Rebelo, ministro do Exército e da Defesa, proibiu a participação dos oficiais no activo. Com esta decisão transformou o congresso numa reunião ao nível das que a Legião Portuguesa costumava realizar.
Na sequência da Operação Amílcar Cabral o PAIGC continuava a atacar as forças portuguesas que retiraram de Guileje e se refugiaram em Gadamael.
Ao final do dia 1 de Junho, uma mensagem do comandante do COP 5 em Gadamael referia que, apesar da debandada, um grupo de tropas ainda se mantinha no quartel, mas que o “centro cripto tinha sido destruído”. A mensagem especificava ainda que o “aquartelamento estava parcialmente destruído”, com transmissões “deficientes” e que a “rede de arame farpado fora destruída parcialmente” e terminava com uma avaliação: “Situação gravíssima”.
A 2 de Junho seguiu para Gadamael mais uma companhia de Pára-quedistas de reforço, juntamente com um pelotão de Artilharia com obuses de 14cm e o comando do COP 5 passou para o major Pára-quedista Pessoa.
Nesse dia, a companhia de Cacine era atribuída ao capitão de Cavalaria Manuel Monge, mandado seguir de Bissau e a lancha de fiscalização grande (LFG) Orion recolhia militares e elementos da população refugiados no tarrafo, na região da confluência do rio Cacine com o rio Cachina, num total de 300 indivíduos, alguns feridos ligeiros.
Morte de um oficial Fuzileiro no Leste de Angola e reacção violenta das tropas.
Numa emboscada a uma coluna de reabastecimento de Fuzileiros, que se deslocava do Chilombo para Lumbala para ir buscar correio, faleceu um subtenente da Companhia de Fuzileiros. Foi o único oficial Fuzileiro a morrer em campanha durante os 13 anos de guerra.
Esta emboscada deu origem a uma violenta vingança do pessoal do Destacamento da Marinha do Zambeze sobre as populações do Chilombo. Na sequência deste incidente, o comandante foi exonerado de funções.
Pedido de retirada das forças portuguesas de Gadamael.
Nos dias 3 e 4 de Junho, Gadamael esteve sujeita a flagelações continuadas, com o rebentamento de mais de 200 granadas de morteiros de 120mm e canhões sem recuo que causaram seis mortos e oito feridos.
Além de todo o Batalhão de Caçadores Pára-quedistas no terreno, estavam no local várias unidades da Marinha e um grupo de assalto de Fuzileiros africanos. No dia 5 quatro botes do Destacamento de Fuzileiros Especiais 22, embarcações Sintex do Exército e meios das unidades navais do Task Group 6 evacuaram os mortos e feridos e ainda um “número incontrolável” de fugitivos (civis e militares) encontrados à entrada do rio para Gadamael.
Nesse dia, o comandante do COP 4, tenente-coronel Araújo e Sá, dos Pára-quedistas, assumiu o comando do COP 5.
A situação começava a ficar controlada e Gadamael foi mantida.
Os militares portuguesas sofreram, neste ataque a Gadamael, 24 mortos e 147 feridos.
Guidage, Guileje e Gadamael: os três G que marcaram o início do fim da guerra, ou “O Inferno da Guiné”
Durante o mês de Maio de 1973, a guerra na Guiné entrou num ponto de não retorno para as forças portuguesas. A manobra em tenaz que as unidades do PAIGC realizaram ao atacarem quase simultaneamente no Norte, em Guidage e no Sul, primeiro em Guileje e depois em Gadamael, revelaram que as Forças Armadas Portuguesas na Guiné tinham esgotado a sua capacidade de reacção a ataques combinados e de controlo do território.
As forças portuguesas que já tinham perdido a iniciativa táctica após a ocupação do Cantanhez nos finais de 1972, perderam neste mês a capacidade para resistirem e manterem-se em duas frentes. Obrigadas a empenharem o grosso das suas forças para manterem Guidage, já não dispunham de reservas para acorrer ao Sul.
O PAIGC, pelo seu lado, ficou a saber que dispunha de capacidade para desencadear dois ataques em força e vencer um. Depois de Marcelo Caetano ter impedido Spínola de negociar uma solução política, Senghor apoiava agora decididamente o PAIGC. Graças à intransigência de Caetano, o PAIGC dispunha agora de bases no Senegal e na Guiné-Conacri, de onde podia atacar simultaneamente.
Poderia repetir a manobra sucessivamente e iria fazê-lo no início de 1974 com o cerco a Canquelifá, onde o Batalhão de Comandos conseguiu resistir por duas vezes, mas se fosse aberta outra frente já não haveria reserva quando os Páraquedistas fossem empenhados.
Durante o mês de Maio e nestes grandes ataques a Guidage e a Guileje, as forças portuguesas sofreram 63 mortos e 270 feridos.
Não era possível a opinião pública portuguesa e os seus militares da Guiné aceitarem repetir este número de baixas numa guerra para a qual o poder político não apresentava qualquer solução.
Proposta de António de Spínola para atribuição à Guiné de uma Companhia de Sapadores com o fim de reforçar os meios de levantamento de campos de minas lançadas pelo PAIGC em torno de alguns quartéis.
Memorando enviado ao chefe do Governo pelo general Kaúlza de Arriaga, afirmando que “o esforço inimigo, em Moçambique ou relacionado com este território, acentua-se cada vez mais”.
Prosseguia o general: “E aquele inimigo tem melhorado e aumentado muito as suas possibilidades, tudo indicando poder continuar a fazê-lo. É a infiltração constante de elementos inimigos e de muito material. É a subtileza chinesa que:
a. Por um lado, lhe confere capacidade para, cada vez mais a Sul, aliciar e preparar para a acção violenta massas populacionais sem que disso a nossa polícia se aperceba, em termos de poder actuar ou de conduzir à actuação das Forças Armadas;
b. Por outro lado, lhe confere capacidade para, também cada vez mais a Sul, realizar pequenas acções terroristas mas de grande projecção psicológica, logo seguidas de fuga muito bem preparada e normalmente de diluição nas populações com detecção quase impossível.
É o equipamento russo moderno, como bazookas, canhões sem recuo, RPG rebentando no ar, mísseis terra-terra de 122mm, metralhadoras antiaéreas e, brevemente, mísseis terra-ar auto dirigidos, etc., que:
a. Por um lado, lhe confere em relação a nós superioridade no combate terrestre.
b. Por outro, lhe permitirá, dentro de pouco tempo, criar dificuldades aos nossos meios aéreos. É a possibilidade do inimigo vir a empregar tropas regulares, lanchas equipadas com mísseis e torpedos e mesmo aviões. E é a tremenda propaganda e acção psicológica desenvolvida por todos os nossos adversários”. (Kaúlza de Arriaga, Guerra e Política, pp. 183-184).
Reunião de Comandos em Bissau com a presença de Costa Gomes, para análise da situação na Guiné, de que resultou a orientação – remodelar o dispositivo, trocar espaço por tempo.
A reunião realizou-se no Quartel-General do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné e foi presidida por Costa Gomes.
Estavam presentes o general Spínola, os comandantes do Exército, da Marinha e da Força Aérea, o comandante-adjunto operacional e os chefes das repartições de operações e de informações para fazerem as apreciações e tirarem as conclusões das diversas sessões de trabalho presididas por Costa Gomes durante a sua visita à Guiné.
Nestas sessões foram analisados os factores que caracterizavam a situação e as “claras perspectivas do seu contínuo agravamento” e definidos os “parâmetros orientadores da manobra face à conjuntura e à sua evolução”.
Meios e efectivos do PAIGC
O efectivo total das forças de guerrilha organizadas era estimad0 entre nove e 10 mil combatentes, um número pouco inferior aos efectivos militares combatentes portugueses.
Melhor armados e com mais elevada mobilidade, os guerrilheiros alcançavam a superioridade táctica no terreno.
Efectivos do PAIGC:
185 bigrupos (cada um equivalente a uma companhia menos);
16 grupos de morteiros e canhões sem recuo (cada um com seis canhões sem recuo e seis morteiros 82mm);
Dois grupos de morteiros de 120mm;
Nove grupos de foguetões de 122mm;
Dois grupos de artilharia antiaérea convencional;
Nove grupos de mísseis antiaéreos (Strela);
16 grupos de sapadores;
Dois pelotões de carros de combate (cinco carros cada um – BTR);
Duas baterias de artilharia antiaérea (57mm e 85mm);
Peças de 130mm.
Possibilidades do PAIGC
Com estas forças e estes meios o Comando português considerava possível que o PAIGC pudesse atacar com sucesso qualquer das guarnições das sedes dos batalhões da fronteira norte, como já tinha atacado Guidage; que pudesse atacar com sucesso as duas guarnições de batalhões junto à fronteira: Piche e Aldeia Formosa, ou atacar as guarnições de companhias em Canquelifá, Buruntuma, Gadamael e Cacine.
Estas possibilidades eram ampliadas pela eficácia da defesa aérea do PAIGC e pelo emprego dos mísseis Strela, que limitavam as possibilidades de apoio aéreo próximo. Em resumo, o Estado-Maior de Spínola considerava que o PAIGC podia aniquilar qualquer das guarnições a norte do rio Cacheu – Farim, Canjambari, Fajonquito e Canquelifá e a leste e sul as guarnições da linha Canquelifá – Dará – Canjadude – Xitole – Buba – Rio Cumbijã.
A curto e médio prazos, associado à intervenção de uma força aérea inimiga, afectar ou destruir os órgãos de comando e logísticos em Bissau, Bafatá e Nova Lamego.
A manobra de Spínola
A manobra proposta para fazer face a estas possibilidades foi uma acção retardadora em profundidade para “ganhar tempo e consolidar um reduto final que in extremis, ainda possa permitir a solução política do conflito”.
Para a constituição deste reduto eram considerados pontos-chave a manter a todo o custo: Aldeia Formosa, Cufar, Catió, Farim, Nova Lamego, Bafatá, a Ilha de Bissau, associados às regiões de Bula e de Mansoa.
O dispositivo proposto: um reduto central
A situação aconselhava a um retraimento do dispositivo militar português que devia ficar com todas as unidades aquém da linha geral Rio Cacheu – Farim – Fajonquito – Paunca – Nova Lamego – Aldeia Formosa – Catió, para evitar o aniquilamento das guarnições de fronteira.
Foi neste novo dispositivo que Spínola e Costa Gomes acordaram em 8 de Junho.
Esta solução de último recurso tem sido apresentada como prova de que no seu regresso a Lisboa Costa Gomes considerou a situação da Guiné como controlada e que o território era defensável.
Esta solução é a clara admissão de que as forças portuguesas abdicavam da posse de boa parte do território da Guiné e das suas populações para se concentrarem num reduto central. A soberania portuguesa seria assim apenas formal.
A partir da declaração de independência que o PAIGC veio a fazer em Setembro, e logo reconhecida por 88 países, este reduto seria sujeito a ataques que poderiam contar com forças regulares de países africanos e que teriam justificação face ao direito internacional, pois Portugal já era considerado pelas Nações Unidas como ocupante ilegal do território. O reduto central seria militarmente e politicamente cada vez mais indefensável.
Com a adopção de uma estratégia deste tipo, o Governo português sujeitava as Forças Armadas a uma derrota humilhante e o país a uma situação de vexame internacional.
Uma delegação da FRELIMO, chefiada por Samora Machel, visita Moscovo.
A FRELIMO era habitualmente considerada pelos analistas mais próxima da China do que da URSS, também pela sua relação privilegiada com a Tanzânia, que mantinha uma aliança com aquele país. Mas a FRELIMO procurou preservar a sua autonomia política e estratégica e a visita a Moscovo de uma delegação chefiada por Samora Machel fez parte dessa linha de actuação. A Rússia deu grande importância a esta visita, já que a delegação moçambicana foi recebida por Boris Ponomarev, secretário do Comité Central do PCUS.
Insistência de Kaúlza de Arriaga para a concentração dos comandos-chefes de Angola e de Moçambique.
Kaúlza enviou uma carta a Marcelo Caetano advogando de novo a solução de um Comando-Chefe único para Angola e Moçambique e colocando-se à disposição para o exercício de “tão complexo e pesado cargo”. A substituição de Kaúlza de Arriaga em Moçambique já estava decidida. O ministro da Defesa, Sá Viana Rebelo, tinha enviado a 31 de Maio uma carta a comunicar que a sua comissão terminava a 31 de Julho e este oferecimento foi visto por alguns ministros e comandantes militares como uma tentativa de sair por cima da sua mal sucedida comissão em Moçambique. Marcelo Caetano recusou o oferecimento, escudando-se nos pareceres do Conselho de Ministros e do Conselho de Defesa Nacional.
Realização da quinta reunião de alto nível do Exercício Alcora, em Pretória, em que se discutiram formas de organização do previsto “Quartel-General Permanente Combinado Alcora”.
A quinta reunião de alto nível do Exercício Alcora realizou-se mais uma vez em Pretória. Ao fazer o balanço geral das actividades, o presidente da reunião, general W. R. van der Riet, da África do Sul, salientou algumas informações importantes.
Em primeiro lugar, disse “que os três Governos Alcora” já haviam aprovado o “Conceito Estratégico Global Alcora”. Depois, que a Subcomissão de Informações tinha “revisto a ameaça (Janeiro de 1973), particularmente no que se refere a uma possível ameaça convencional contra os territórios Alcora por volta de 1976”, pelo que tinha sido decidido discutir a ameaça num ponto específico da agenda.
Finalmente, o presidente acrescentou que tendo sido determinado à subcomissão de Comando e Controlo que “elaborasse propostas relativas à organização, funções, modus operandi e requisitos em pessoal para um Quartel-General Permanente Combinado Alcora”, esta tinha recomendado um ”Estado-Maior Permanente Alcora”, mas que os acontecimentos tinham ultrapassado essa proposta. De facto, “a proposta da RAS relativa a uma mais ampla organização foi discutida entre os ministros da Defesa de Portugal e da RAS que concordaram com o estabelecimento de uma Organização Permanente de Planeamento Alcora (PAPO)”. Mais, o presidente “expressou a sua satisfação pelo facto de todas as deliberações Alcora relativas a uma organização permanente” terem sido aprovadas pelos dois governos, sendo de salientar que a RAS se ofereceu “para fornecer acomodação e serviços administrativos requeridos pela PAPO em Pretória”. A estas informações, um representante rodesiano declarou que “o Governo Rodesiano aceitou em princípio as propostas feitas para a PAPO e acrescentou que os rodesianos estavam muito gratos e sensibilizados com a RAS pelo convite”, tendo o representante português acrescentado que “a delegação portuguesa se sentia muito satisfeita com o facto da PAPO ser estabelecida”, chamando a atenção para dois factos recentes:
“os governos africanos tinham recentemente feito grandes esforços com o fim de resolver os seus diferendos e tinham progredido nos seus esforços contra nós” e “o acordo sobre a guerra do Vietnam podia conduzir ao fortalecimento das organizações terroristas e ao seu apoio com um aumento do fornecimento de armas e material”.
Por isso, acrescentava o representante português, “o trabalho a realizar durante esta reunião seria da maior importância para a África Austral”.
Carta de Marcelo Caetano a Kaúlza de Arriaga a negar o comando conjunto de Angola e Moçambique.
Kaúlza de Arriaga tinha feito uma proposta a Marcelo Caetano para que o Comando-Chefe das Forças Armadas em Angola e em Moçambique fosse “atribuído a uma mesma pessoa”, que seria apoiado por dois comandos-chefe adjuntos, um para cada território.
Nesta carta Marcelo Caetano rebateu os argumentos de Kaúlza de Arriaga dizendo, em resumo:
“Os teatros de operação, as forças de subversão e os partidos inimigos são completamente diferentes nas duas províncias e exigem a actuação e métodos especiais. Não é possível dispor de uma reserva de comando constituída em Angola para intervir em Moçambique sem fazer perigar a segurança de Angola (Kaúlza tinha proposto constituir uma reserva de intervenção de 10 000 homens que seriam utilizados em Angola ou em Moçambique, o que exigia uma frota de aviões de transporte), a fixação da sede desse comando-chefe deixaria sempre à província que não a tivesse a impressão de ficar secundarizada”.
Ataque a um táxi aéreo na Gorongosa, com a morte de um passageiro espanhol, o general da Força Aérea de Espanhola, Angel Garaizabal Bastos, tendo ficado ferido um industrial de nome Enrique Osborne-Mac-Pherson. Ambos eram amigos de Franco e o ataque teve grande repercussão em Espanha.
Criação de um movimento liberal anti-apartheid de brancos na África do Sul.
Cerca de 400 cidadãos sul-africanos, a maioria académicos, reuniram-se em Joanesburgo num jantar presidido por William Joubert, professor de Direito, e criaram o movimento Verlignete Action (Acção Esclarecida), destinado a estudar novas soluções para a África do Sul.
O célebre cirurgião Barnard, também presente na reunião, advertiu que o movimento não teria futuro a não ser que entrasse em contacto com a população negra do país.
Conhecida a ideologia de apartheid do regime, a realização de uma reunião com estes objectivos era um sinal de que algo estava a mudar na percepção quanto ao futuro dos brancos sul-africanos.
Novo telegrama do ministro da Defesa ao general Kaúlza de Arriaga, nas vésperas de este abandonar Moçambique, referindo o pedido de reforços.
Dizia o telegrama:
“Quero acreditar esteja extraindo rendimento máximo dos meios existentes embora note que, apesar de algumas expressões dos seus discursos, a situação piorou em Moçambique durante os últimos doze meses”.
A 9 de Julho, em novo telegrama, o ministro da Defesa dizia:
“Tenho notado seus numerosos discursos neste final da sua comissão. Parece estarem anunciadas declarações suas aos órgãos de informação. Não sei o que tenciona dizer, mas lembro que notícias sobre actos terroristas próximo da Beira recomendam a maior prudência”.
Carta de Marcelo Caetano a Kaúlza de Arriaga anunciando-lhe o fim da sua comissão em Moçambique: a carta fatal.
A carta de Marcelo Caetano contém uma crítica violenta e clara ao modo como ele exerceu o seu cargo:
“Reconheço a vantagem, para si, para Moçambique, para todos nós, em outra pessoa rever os conceitos e as tácticas da acção anti-subversiva em Moçambique”.
Solução Kaúlza – uma via destinada à derrota
O conceito de sobrevalorização daacção militar relativamente às outras componentes (baseando a decisão no diferencial de potencial de combate entre as forças regulares e as forças da guerrilha) foi empregue por vários generais europeus e americanos em conflitos de idênticas características, na Indochina, na Argélia e no Vietname. Mas Kaúlza de Arriaga será, porventura com os generais Carrasco e Hipólito, dos poucos generais portugueses que optou deliberadamente por ele. Ao contrário de outros generais que colocaram as suas forças a combater segundo os métodos e os princípios do inimigo, ele levou até ao limite a fé na superioridade das suas forças (e, porventura, da sua civilização e do seu próprio destino). A sua manobra, ou a solução Kaúlza de Arriaga, é a que mais se aproxima da dos franceses e dos americanos na Indochina/Vietname. Uma manobra militar convencional, exigindo grandes meios, em que as populações constituem uma preocupação menor e que pode ser sintetizada pelos seguintes factores:
Máxima ideologização do fenómeno das lutas anticoloniais, reduzindo-o a uma mera componente do conflito Leste-Oeste e da estratégia da URSS;
Sobrevalorização da acção militar, com a criação de grandes comandos específicos, uns para grandes operações em qualquer parte do território (COFI), outros para defesa de pontos fortes (CODCB);
Manobra militar de cariz convencional para conquista de objectivos no terreno e aniquilamento de unidades de guerrilha e intenso emprego de forças de assalto (intervenção);
Depreciação do papel das populações negras na manobra, quer das instaladas em zona de guerra, quer das que viviam ainda em zonas intermédias, passíveis de acção por parte da FRELIMO e das forças portuguesas, tomadas mais como elementos perturbadores da manobra do que como objectivo, o que foi particularmente visível na zona de Tete com o aldeamento forçado.
Separação dos seus objectivos relativamente aos das populações de origem europeia ou asiática e dos seus líderes, nomeadamente o engenheiro Jardim, que o colocou perante situações de facto (e aos governadores, diga-se), desenvolvendo uma estratégia própria, que de umas vezes o manteve à margem das suas acções, de outras o obrigou a segui-lo e quase sempre o deixou sozinho com as suas tropas.
Difícil relacionamento entre militares, civis e serviços de informações, o que limitou a acção política e político-social e a coordenação de esforços, que teve, entre outras, como consequência uma tardia concentração de comando militar e civil na zona decisiva de Tete e uma fraca capacidade de antecipação às acções do seu inimigo;
Emprego das suas forças preferencialmente em acções de reacção às acções inimigas e utilização de forças especiais africanas como forças regulares, limitando a sua eficácia.
Esgotamento de uma má solução
Sendo o mais político dos generais que comandaram teatros de operações, Kaúlza de Arriaga foi o que menos espaço e menos tempo concedeu à política para ela procurar soluções para a guerra. A sua acção, baseada na força, contra um movimento de libertação politicamente bem estruturado, que aumentava continuamente o seu potencial de combate e as áreas onde o empregava, conduziu-o a um ponto em que não lhe restava mais que exigir sempre novos reforços e apoios.
Mas em 1973 o seu crédito de promessas de vitória estava esgotado. Sucedeu-lhe um general de personalidade serena para limitar estragos e ganhar tempo, o general Basto Machado.
Denúncia do massacre de Wiriyamu feita pelo padre inglês Adrian Hastings no jornal The Times de Londres.
O padre Adrian Hastings era um membro influente da Igreja Católica em Inglaterra e possuía boas relações em Roma, onde tinha estudado no colégio da Propaganda e Fé, além de pertencer à ordem beneditina dos Padres Brancos dos missionários que haviam recebido os testemunhos das vítimas de Wiriyamu. Era licenciado em História pelo Worcester College da Universidade de Oxford e trabalhou na diocese de Masaka, no Uganda, dirigida pelo bispo Joseph Kirwanuka, ao tempo o único bispo negro de África. Era ainda um activo participante do movimento de renovação da Igreja Católica iniciado com o Concílio Vaticano II e trabalhava como professor do seminário junto de estudantes africanos. Recebera ainda a incumbência dos bispos ingleses de preparar notas de introdução ao concílio para serem enviadas para as dioceses africanas de língua inglesa do Quénia, Malawi, Tanzânia, Uganda e Zâmbia.
Hastings estava, portanto, muito envolvido com a situação em África, com as relações entre europeus e africanos e era uma figura intelectualmente respeitada. Ao assinar o artigo de denúncia dos massacres em Wiriyamu num jornal conceituado como The Times, o assunto seria tomado a sério.
Carta de Gonçalo Mesquitela, presidente da ANP em Moçambique, para Marcelo Caetano, informando que em Moçambique se sentiam preocupações no aspecto militar.
Dizia o informador:
“A situação no istmo de Tete, a aproximação de actividades terroristas na Beira e a “infecção” de Vila Pery instalam na opinião pública um princípio de alarme que pode agravar-se. A DGS parece ultrapassada pelos acontecimentos. A informação militar não consegue supri-la. E as surpresas sucedem-se. O trabalho de sapa do inimigo é notavelmente bem organizado e, mesmo para além da sua acção junto dos africanos, a técnica de boato e de descrédito de pessoas e de obras tem de ser objecto de exame sério e de contra-medidas que evitem os resultados positivos que estão obtendo”
Visita de uma delegação da FRELIMO à República do Zaire.
Uma delegação constituída por Samora Machel, Joaquim Chissano e Óscar Monteiro visitou o Zaire e teve uma audiência com Mobutu em Kinshasa.
Este encontro revelava o interesse do Zaire de Mobutu em diversificar as suas relações com os movimentos de libertação das colónias portuguesas para além da FNLA.
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