1970 - A ilusão das grandes operações

1970
Operação Nó Górdio - Uma pedrada no vespeiro

A Operação Nó Górdio

No mesmo dia em que, no Vaticano, o Papa recebia os líderes dos três movimentos de libertação, Kaúlza de Arriaga, um fervoroso católico, lançava em Mueda a grande Operação Nó Górdio no coração do planalto dos Macondes, o único povo cristianizado em Moçambique.

A Operação Nó Górdio iniciou-se com a presença do general comandante-chefe e do seu Estado-Maior em Mueda. Nela participaram mais de 8000 homens, uma concentração que esgotou as reservas disponíveis, pois empenhou a totalidade das unidades de forças especiais, Comandos, Pára-quedistas, Fuzileiros e até os Grupos Especiais (GE) recém-criados, mais a quase totalidade da Artilharia de campanha, das unidades de reconhecimento e de engenharia.

 

Base de ataque das forças portuguesas à base Gungunhana da FRELIMO. [AMG]

 

O conceito da operação era um misto de cerco e batida com grandes meios. Previa o isolamento da área do núcleo central do planalto, onde se encontravam as grandes bases Gungunhana, Moçambique e Nampula, pela montagem de um cerco ao longo dos itinerários Mueda-Sagal-Muidumbe-Nangololo-Miteda-Mueda (cerca de 140 km) e, após conseguido o isolamento da área, o assalto e destruição dos principais objectivos do núcleo central:

  • Objectivo A – Base de Artilharia Gungunhana;
  • Objectivo B – Base Provincial Moçambique;
  • Objectivo C – Base Nampula.

As acções militares eram conjugadas com uma intensa campanha de acção psicológica, para provocar a rendição e a desmoralização do inimigo e a manobra no terreno era apoiada com fogos de Artilharia e de aviação, em acção de flagelação e de concentrações de fogos sobre os objectivos.

Para criar condições de aproximação aos objectivos foram organizados agrupamentos à base de engenharia que procederam à abertura simultânea de picadas. Para o cerco foram constituídos dois agrupamentos (Norte e Sul), com unidades de caçadores e de reconhecimento e quatro agrupamentos de intervenção, um para cada objectivo e o quarto para reserva.

Os agrupamentos de assalto dispunham de uma composição interarmas, do tipo task force, incluindo unidades de forças especiais, forças regulares, de apoio de fogos, com Artilharia e morteiros e de engenharia, que abriu picadas tácticas até às proximidades dos objectivos, onde foram criadas as bases de ataque para as forças de assalto.

A operação foi concebida como uma manobra do tipo convencional, em que se pretendeu alcançar com um ataque em força o que do antecedente não fora conseguido empregando a surpresa.

 

Execução da operação

A 1 Julho os agrupamentos de cerco iniciaram a sua instalação e os agrupamentos de assalto A e B começaram o seu movimento para os objectivos. Os Pára-quedistas progridem de Nangololo para a base Moçambique, com o apoio da engenharia na abertura da picada desde Capoca até Gole; os Comandos da estrada Mueda-Miteda para a base Gungunhana.

A 6 de Julho os Comandos localizam e assaltam a base Gungunhana, que não se encontrava na localização prevista. A base fora abandonada recentemente, ocupava uma área de 100×500 metros, dispunha de mais de 100 palhotas, era circundada por uma vala, tinha abrigos contra morteiros e ataques aéreos.

Os Pára-quedistas assaltam a base Moçambique, que também se encontrava abandonada, neste caso há dois meses e que era constituída por cerca de 200 palhotas.

A 15 de Julho os Fuzileiros atingem a Base Nampula, objectivo C, constituída por cerca de 50 palhotas que se encontrava abandonada há dois meses.

A partir de 16 Julho e até 6 de Agosto realizam-se acções de permanência e consolidação de posições, de forma a eliminar todas as organizações inimigas e capturar populações. 

 

Abrigo da base Gungunhana. [AMG]

 

 

Unidades participantes Forças de Assalto Agrupamento IA (Comandos) Objectivo A – Base Gungunhana

  • 1ª CComandos/M
  • 17ª CComandos
  • 18ª CComandos
  • 23ª CComandos
  • CCaç 2666
  • CCaç 2730
  • DFE 11
  • GE 205
  • Dois Pel Mort 81
  • Dest. Engenharia

 

Agrupamento IB (Pára-quedistas) Objectivo B – Base Moçambique

  • 1ª/BCP 31
  • 2ª/BCP 31
  • 1ª/BCP 32
  • 2ª/BCP 32
  • CCaç 2468
  • CCaç 2665
  • GE 203
  • Dois Pel Mort 81
  • Dest Engenharia

 

Agrupamento IC (Fuzileiros) Objectivo C – Base Nampula

  • DFE 5
  • DFE 11
  • 18ª Ccomandos
  • 21ª Ccomandos
  • 2ª/BCP31
  • CCaç 2666
  • GE 201
  • Pel Mort 81
  • Dest Engenharia

 

Forças de Cerco – Cerco Norte Cerco Sul

  • 1ª BCaç 15 CCaç 2407
  • CArt 2718 CCaç 2408
  • CArt 2719 CArt 2646
  • CCav 2399 CArt 2648
  • CCav 2400 CCav 2398
  • ERec 2 ERec 1

 

Apoio de Fogos Apoio de Combate

  • Comando da Artilharia 1ª C Eng – Três Baterias Art 8,8cm C Eng 2736
  • Em Apoio Directo aos Agrupamentos de Assalto: Companhia de Morteiros 81mm

 

Evacuação de um ferido numa maca improvisada. [AJM]

 

Forças Terrestres Empenhadas

  • Comandos Operacionais 7
  • Companhias de Caçadores (CCaç) 7
  • Companhias de Artilharia (CArt) 4
  • Companhias de Cavalaria (CCav) 3
  • Destacamentos de Fuzileiros 2
  • Companhias de Comandos 5
  • Companhias de Pára-quedistas 4
  • Grupos Especiais (GE) 3
  • Esquadrões de Reconhecimento (ERec) 2
  • Companhias de Morteiros 1
  • Baterias de Artilharia 3
  • Companhias de Engenharia 2

 

Apoio Aéreo

A Força Aérea apoiou a Operação Nó Górdio com meios de ligação, reconhecimento e fogo.

A partir do AM 51 (Mueda) foram empregues os seguintes tipos de aeronaves:

  • DO-27 (Ligação e Reconhecimento)
  • T-6 (Reconhecimento, Ataque e Apoio de Fogo)
  • Fiat G-91 ( Ataque e Apoio de Fogo)
  • DC-3 (Transporte, Ligação e Acção Psicológica)
  • Helicópteros AL III (Transporte de Assalto e Manobra, Evacuação).

O emprego de meios aéreos na Operação Nó Górdio recebeu o nome de código de Operação Santuário.

 

Resultados

  • Guerrilheiros mortos (combate) – 67 Capturados

 

Forças Portuguesas

  • Mortos – 22 militares e quatro civis
  • Feridos graves – 27
  • Feridos ligeiros – 55
  • Baixas por minas e engenhos explosivos – 15 mortos; 27 feridos graves e 31 feridos ligeiros.
  • Viaturas destruídas e danificadas – 15
  • Minas detectadas – 155

 

Apreciação final

Na apreciação final da situação pelo comando português, com a destruição do “mito” do Núcleo Central, “toda a iniciativa no Distrito de Cabo Delgado passou, sem qualquer dúvida, para as FN (Forças Nacionais)”.

Pelo seu a lado, a FRELIMO seguiu as máximas de Sun Tsu, de retirar quando o inimigo ataca, de o atacar quando ele se movimenta. Reagiu à movimentação das forças portuguesas na abertura das picadas tácticas, quando estas se encontravam mais vulneráveis; não defendeu as bases porque o terreno não é importante na guerra de guerrilha. As populações tinham, por sua vez, abandonado a área de operações pelo que não se verificaram capturas nem apresentações, apesar das intensas campanhas de acção psicológica, utilizando meios aéreos de difusão de mensagens.

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