Quem eram os Flechas?
Os Flechas foram uma organização armada dependente da PIDE que surgiu em 1967. Os Flechas distinguiam-se da pequena multidão de outras forças criadas pelas autoridades portuguesas nos três teatros de operações e que contribuíram para a africanização da guerra – GE, GEP, Milícias, TE, Fiéis, Leais, Comandos, Fuzileiros, Caçadores Nativos e até Polícias Militares –, por serem inicialmente uma força privativa da PIDE e por terem uma origem étnica e geográfica restrita – todos pertenciam ao grupo étnico dos bosquímanes, ou hotentotes, um povo que habitava o deserto do Kahalari, na fronteira entre Angola e a Namíbia.
A missão da PIDE e a necessidade dos Flechas
Durante a guerra, a PIDE (DGS a partir de 1969) foi responsável pelas operações de recolha de informações estratégicas, investigação e acções clandestinas contra os movimentos guerrilheiros, em apoio das Forças Armadas e de Segurança.
A necessidade de dispor de uma força especial armada para auxílio e protecção dos agentes nas operações foi o argumento oficial usado pela PIDE de Angola para justificar a criação dos Flechas.
Para criar esta força a PIDE inspirou-se no modelo dos pseudo-gangues da guerra do Quénia e dos selous scouts que os rodesianos estavam a organizar, integrando antigos militantes das organizações anti-apartheid nas suas unidades de reconhecimento. Os membros dos Flechas eram enquadrados por agentes da PIDE e necessitavam de muito pouco treino para operarem. Combatiam em pequenos grupos, ou em operações autónomas da PIDE, utilizando os mesmos métodos dos guerrilheiros.
A origem do nome Flechas
Como os bosquímanes eram pequenos e não conseguiam carregar armas pesadas, continuaram a utilizar os seus arcos e flechas com pontas venenosas. Os guerrilheiros ficavam aterrorizados com estas armas e dado o temor que isso provocava, estes homens chamaram-lhes “Flechas”.
O saque como pagamento
No início da sua actividade, a PIDE começou por lhes pagar com o saque que conseguiam, mais tarde o método foi alterado e passaram a receber um salário, assim como lhes foram distribuídas armas convencionais, além do arco e flecha, sendo equipados com o armamento em uso no Exército Português, ou capturado aos guerrilheiros.
Mais tarde, os Flechas integraram elementos de outras etnias além dos bosquímanes, e espalharam-se um pouco por todo o Leste e mesmo pelo Norte.
Operações pseudo terroristas
Algumas das operações frequentemente realizadas eram as chamadas pseudo terroristas, em que os Flechas se disfarçavam de guerrilheiros inimigos para atacarem alvos que não podiam ser abertamente atacados por forças identificadas como portuguesas (alvos em território estrangeiro, missões religiosas que auxiliavam guerrilheiros, bases de difícil aproximação).
Conflitos entre a PIDE e as Forças Armadas
Com o decorrer da guerra, a PIDE foi progressivamente alargando o tipo de actuação dos Flechas que, no início, eram basicamente usados como guias e pisteiros dos agentes da PIDE e passaram posteriormente também a ser usados como forças de assalto em operações especiais.
Este alargamento do campo de acção para áreas das Forças Armadas não foi pacífico e causou conflitos de competências entre comandantes militares e dirigentes da PIDE. Para os militares não eram claras as razões que levavam a PIDE a dispor de unidades operacionais e autonomia de acção para as empregar. Nos relatórios militares portugueses os Flechas são simplesmente designados como: “Auxiliares/DGS”.
A chegada de Costa Gomes
Só a chegada de Costa Gomes a Angola, como comandante-chefe, regularizou as relações. Este, depois de um confronto entre Flechas e uma companhia de Comandos, colocou-os sob a sua dependência. O director da PIDE, São José Lopes, concordou com esta subordinação, pois partilhava com este general o conceito da prioridade ao Leste, prioridade que Almeida Viana, o antecessor de Costa Gomes, não considerava justificar-se, por não ver, nem existirem, indícios palpáveis de agravamento da situação naquela zona.
Leste: A guerra que não podia existir!
Aquilo em que Costa Gomes e São José Lopes estavam de acordo e que a formação militar de Almeida Viana não o deixava entender era que a riqueza do subsolo do Leste, a importância das grandes companhias – a Diamang no Nordeste e a Companhia Mineira do Lobito (minas de Cassinga) no Sul – e a pressão dos vizinhos sul-africanos na fronteira da Namíbia não permitiam uma guerra no Leste.
A PIDE e o controlo do Leste através de “tropas transfronteiriças”
A importância do Leste, a necessidade de não existência de guerra no Leste, ou, no mínimo, a garantia de que o nível de violência não punha em risco as grandes xplorações, fez aumentar o poder da PIDE e das forças por ela controladas. Os Flechas eram de facto verdadeiras tropas transfronteiriças, guarnecidas por elementos de etnias instaladas de ambos aos lados das fronteiras da Conferência de Berlim, que podiam actuar com conhecimento do terreno e impunidade. Na Lunda, a norte, os “Fiéis” catangueses, eram uma força auxiliar à volta da Diamang e que podiam actuar no Shaba, o antigo Catanga; a sul, os Flechas combatiam tanto o MPLA como a SWAPO, o que agradava aos sul-africanos, junto à fronteira com a Zâmbia e com a Namíbia. A PIDE ainda tentou organizar um grupo com dissidentes zambianos, a que deu o nome de Leais, mas o seu pequeno efectivo (uma companhia) não permitiu fechar o cerco e foi essa a porta de entrada para a Rota Agostinho Neto, que era também o único corredor entre a Diamang e as minas da Companhia do Lobito, por onde podiam tentar progredir. Foi neste corredor, na linha geral do Caminho-de-Ferro de Benguela, que se concentraram, a partir de 1969, os melhores e os mais importantes efectivos militares de Angola e que foi montada a maior e a melhor empresa militar da guerra.
Efectivos dos Flechas em 1974
Grupos Efectivos
Zona Militar Norte ZMN 10 456
Zona Militar Leste ZML 31 1665
Zona Militar Sul ZMS 1 35
Total 42 2156
Nota – 86% dos efectivos dos Flechas encontravam-se na ZML.
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