Um relatório de situação
Spínola fora nomeado governador e comandante-chefe da Guiné ainda por Salazar. Em Outubro de 1968 mandou o seu Estado-Maior elaborar um relatório da situação do território para apresentar a Marcelo Caetano na sua primeira visita ao novo presidente do Conselho.
O documento resume a análise do então brigadeiro Spínola: “Com efeito não hesitamos em considerar como uma triste realidade a situação que hoje se vive na Guiné, situação que abrange os dois aspectos fundamentais em que se situa a reacção ao processo subversivo, isto é, por ordem de prioridade, o aspecto económico-social e o aspecto militar”.
A era de Spínola foi inaugurada num período em que o PAIGC dispunha de grande liberdade operacional e instalações nos países vizinhos, o que facilitava o efeito surpresa e aumentava a segurança das suas acções, dado que o teatro de operações era pouco profundo. Pelo contrário, a estrutura administrativa portuguesa era fraca, a rede de estradas era má e a malha de rios e pântanos dificultava a mobilidade das tropas, além do clima ser particularmente duro para as tropas portuguesas, 80% das quais eram europeias.
Um início tradicional
Do ponto de vista estritamente militar, antes da acção violenta se generalizar, as primeiras medidas no teatro das operações tomadas por Spínola denotam a sua preocupação de ocupar o território por forças enquadradas segundo a hierarquia habitual – comando-chefe, comando militar, zonas militares, à responsabilidade de comandos de agrupamentos, sectores, entregues a comandos de batalhão, subsectores, entregues a comandos de companhia, e destacamentos de pelotão e por vezes até de secção.
As alterações
Perante o incremento das acções por parte do PAIGC, Spínola altera o dispositivo militar, em finais de 1968, centralizando toda a coordenação da actividade operacional no comando-chefe, retirando ao CTIG (Comando Territorial Independente da Guiné) a função de comando e coordenação das operações das forças terrestres. O CTIG, como o Comando Naval e o Comando da Zona Aérea passaram a ser estruturas eminentemente logísticas e de aprontamento de forças.
Política de autodefesa
A política de agrupar populações em aldeamentos protegidos representava uma cópia parcial da estratégia americana no Vietname e dos franceses na Argélia e visava proteger a população rural dos insurrectos e permitir a sua conquista. Esta política acrescentava responsabilidades e riscos para as autoridades administrativas e para as Forças Armadas, porque as populações passavam a dispor de armamento.
Na Guiné, Spínola consolidou esta política de autodefesa, que incluía também a organização de grupos de milícias. Esta opção teve sucesso no que diz respeito à segurança das populações e aos meios de subsistência.
Em Dezembro de 1971 havia 46 tabancas organizadas em autodefesa, 341 com armamento distribuído e 26 em que os seus elementos colaboravam com as tropas portuguesas, perfazendo um total de 11 163 armas distribuídas à população. De qualquer forma, aquilo que se designa abreviadamente de política de aldeamentos não se aplicava isoladamente e Spínola difundiu outras directivas destinadas à conquista das populações.
“Uma Guiné Melhor”
A ideia, que se transformou num slogan da acção de Spínola, de “Uma Guiné Melhor” surge pela primeira vez de forma expressa na Directiva nº. 60/68, de 17 de Dezembro de 1968.
Nesta directiva, Spínola refere que “um plano de contra-subversão não se projecta no campo imediato da força das armas, mas sim da promoção social e cultural das populações”, por isso, e reforçando ideias que já tinha apresentado em documentos anteriores, adiantava que:
“A guerra da Guiné não se ganha pela força das armas, mas sim pela força da razão. E a razão conquista-se na medida em que a Província atinja um nível de bem-estar social que satisfaça os anseios imediatos das populações, anseios que lhe foram instigados pelo inimigo e que estão na base da sua propaganda, constituindo a sua principal força”.
Para responder a estas necessidades, o plano de contra-subversão de Spínola, “visa a rápida consecução desse nível de bem-estar, que se traduz no slogan: UMA GUINÉ MELHOR”.
Nesta introdução à directiva estão já as linhas de força do seu pensamento na luta de contra-subversão: conquistar as populações, dando-lhes o que a subversão promete. O PAIGC prometia dois grandes objectivos: independência e bem-estar, associando-os. Spínola começa por promover o bem-estar através do slogan “Uma Guiné Melhor” e percorrerá rapidamente o caminho para dar às populações a outra promessa do PAIGC com a política traduzida num outro slogan: “Uma Guiné
de e para os Guinéus”, que era o correspondente à independência do PAIGC.
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