Os blindados em Angola
Embora de forma não persistente, foram utilizados carros de combate na Guerra Colonial. O capitão de Cavalaria Mendes Paulo, mobilizado para Angola, conseguiu, com o apoio da Direcção da Arma de Cavalaria, que o comando do Exército o autorizasse a levar na sua companhia três carros de combate M5A1, um carro ligeiro, idêntico àquele com que as forças canadianas entraram em Paris na II Guerra Mundial e dos quais existiam muitos exemplares em depósito com muito poucas horas e milhas de trabalho.
O chefe de Estado-Maior exarou um curioso despacho a autorizar o transporte destes carros: “… autorizado o embarque como viaturas de acompanhamento do Batalhão de Cavalaria 1927. Trata-se de uma experiência – não é um regular e normal fornecimento de material…”.
Estes carros estiveram em Nambuangongo, foram empregues com sucesso como viaturas de escolta a colunas nas áreas mais perigosas, como as que se dirigiam para a Fazenda Madureira, Zala e Balacende. Foram úteis e justificou-se o seu emprego, mas a experiência não teve continuidade, nem com mais destes carros, nem com outros blindados que assegurassem protecção e poder de fogo necessários para reduzir as baixas. As ideias dominantes do Exército eram as da organização de massas, de grandes efectivos e baixa tecnologia, que privilegiava a quantidade em vez da qualidade, onde o soldado era a componente mais abundante e mais barata, por isso, nas colunas, seguia de corpo exposto em cima de viaturas, desprotegido contra tiros e minas.
A Cavalaria
O Exército Português homogeneizou a maioria das suas forças, constituindo unidades “tipo caçadores” com as tradicionais “armas” não só de Infantaria, como de Cavalaria e Artilharia. Mas algumas mantiveram as suas missões típicas, como foi o caso das unidades de Reconhecimento da Cavalaria.
Estas, equipadas com viaturas ligeiras blindadas, eram adaptadas às missões de abertura de itinerários, de escoltas a colunas de via-turas e de interdição a zonas ou pontos críticos, mas por razões de custos de aquisição, de alguma exigência técnica para a sua manutenção e, principalmente, pela mentalidade conservadora da chefia do Exército, as suas capacidades não foram devidamente exploradas durante a guerra.
Material obsoleto
Os Pelotões de Reconhecimento tinham viaturas Daimler, um scout car inglês da II Guerra Mundial, que apenas dispunha de uma metralhadora ligeira como arma de bordo, ou autometralhadoras Fox, da mesma época, por vezes acompanhadas por “granadeiros”, semiblindados para transporte de atiradores.
Só em 1967 foram organizados pelotões com autometralhadoras AML Panhard de origem francesa, armadas com um morteiro de 60mm e duas metralhadoras. Alguns destes pelotões foram mais tarde reunidos em Esquadrões de Reconhecimento.
Os Esquadrões de Reconhecimento
Em Angola existia, desde antes de 1961, o Grupo de Dragões de Angola, que desempenhou um papel de grande importância na reacção aos massacres de Março de 1961 e na reocupação do Norte de Angola. Este grupo tinha a sua sede em Silva Porto, no Leste, mas manteve um Esquadrão em Luanda. Estava equipado com auto-metralhadoras EBR Panhard, armadas com uma peça de 75mm, e dispunha de uma viatura blindada de transporte de tropas da mesma origem, o ETT. Os EBR eram viaturas inadequadas ao terreno, muito volumosas, pesadas (15 toneladas), com uma peça muito longa e que se movimentavam com grande dificuldade nas picadas abertas a custo na floresta tropical do Norte de Angola. Mas o engenho dos militares em operações superou a má escolha feita pelos especialistas dos estados-maiores, resultante dos seus duvidosos critérios de apreciação de materiais adequados à guerra em África. Erros que se repetiriam em vários outros casos e com outro tipo de material e não são desculpáveis apenas pelas dificuldades de aquisição resultantes do crescente isolamento internacional que a guerra impôs.
Na Guiné e em Moçambique, os Esquadrões de Reconhecimento dispuseram durante a maior parte dos anos que durou a guerra de auto-metralhadoras Fox, armadas com uma metralhadora de 12,7mm, e de viaturas de transporte americanas White ou de granadeiros ingleses. Relíquias do tempo a II Guerra, idênticas às que haviam feito a campanha do Norte de África.
Além da idade e dos problemas mecânicos dela resultantes, também estas eram inadequadas às missões que lhes atribuíam – a escolta por itinerários quase sempre minados. O rebentamento de uma mina numa Fox provocava o desencaixe da torre e a morte do apontador, ao passo que o condutor batia com a cabeça violentamente na blindagem que o devia proteger.
Os investimentos em material moderno
No início dos anos 70 chegaram AML Panhard a Angola e a Moçambique,onde constituíram um Esquadrão que participou na Operação Nó Górdio. Em 1973, estavam a ser fornecidas para a Guiné viaturas Chaimite para um Esquadrão com sede em Bafatá.
Unidades de Reconhecimento
Angola:
Grupo de Dragões Silva Porto
Esquadrões de Reconhecimento – 3;
Pelotões de Reconhecimento (13 mobilizados) – 2 em permanência;
Guiné
Esquadrões de Reconhecimento:
Até 1968 – 1;
De 1968 a 1974 – 2 (Bula e Bafatá);
Pelotões de Reconhecimento Fox – 2;
Pelotões de Reconhecimento Daimler – 11;
Moçambique
Esquadrões de Reconhecimento – 3;
Pelotões de Reconhecimento – 6.
A hipótese dos helicópteros
Desde a guerra da Coreia que os helicópteros eram utilizados pelos exércitos. Os franceses utilizaram-nos intensamente na Argélia e os americanos consolidaram a doutrina do seu emprego em guerra de contra-guerrilha no Vietname.
A Direcção da Arma de Cavalaria levantou a hipótese de ser criada uma “Cavalaria do ar”, mas confrontada com a escolha entre helicópteros e cavalos, optou pelos cavalos…
A guerra a cavalo
O emprego do cavalo na guerra vem de tempos imemoriais. São conhecidas as suas capacidades e limitações.
Em 1966, o comando do Grupo de Dragões de Silva Porto convenceu o director da Arma de Cavalaria da bondade do emprego do cavalo no Leste de Angola e o Estado-Maior do Exército concordou em fazer uma experiência. Nesse ano foram adquiridos os primeiros 30 cavalos na África do Sul e em 1967 foi constituído o primeiro pelotão a cavalo em Silva Porto. Este pelotão comprovou a adaptação dos animais ao clima e a sua utilidade para certos tipos de missões. Mais tarde foi criado o Centro de Instrução de Tropas a Cavalo e adquirido um lote de animais importados da Argentina.
O pleno emprego operacional da primeira unidade a cavalo ocorreu em 1970, com a adaptação de uma Companhia de Atiradores de Cavalaria, que, após um ano de actividade “a pé”, foi instruída para realizar operações montadas, recebendo o reforço de militares vindos do Centro de Instrução.
Esta unidade instalou-se no Munhango, localidade sobre a linha do Caminho-de-Ferro de Benguela, que lhe serviria de base de operações contra os guerrilheiros que utilizavam aquela faixa de terreno como linha de infiltração para o interior de Angola. Dependia tecnicamente do Grupo de Cavalaria 1 e, operacionalmente, constituía uma força de intervenção à ordem da Zona Militar Leste, com sede no Luso. Tinha como principal missão “bater” as zonas de instalação de bases de guerrilha, de modo a obter informações que servissem para o emprego de outras unidades, nomeadamente Comandos e Pára-quedistas, em acções de assalto sobre objectivos bem definidos.
Não era estreia absoluta em África, já que nas campanhas do final do século XIX e no início do século XX, tropas montadas haviam percorrido o Sul de Angola, mas, após a motorização e aviação dos exércitos, este velho meio de deslocação de combatentes no campo da batalha surgiu como novidade e até, para alguns, como um anacronismo numa guerra daquele tipo.
Em 1974, uma unidade do mesmo tipo – um esquadrão a cavalo – estava em fase de ultimação de treinos em Vila Pery, Moçambique, mas já não entrou em operações. O Exército, com os seus vários ministros e secretários de Estado, não quis, não soube, ou não pôde, organizar unidades ligeiras blindadas em quantidade adequada às necessidades de proteger as tropas em deslocamento por terra, nem quis os helicópteros para aumentar a mobilidade táctica, mas aceitou a antiga novidade da Cavalaria em ambiente exótico, como os ingleses haviam feito na Birmânia e os americanos nas Filipinas, dando-lhes uma amplitude sem paralelo em qualquer outro Exército.
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