Civis e militares – uma relação tensa
O despacho conjunto dos ministros do Ultramar e da Defesa de 7 de Outubro de 1967 sintetiza as bases do pensamento militar e político após seis anos de guerra. É fruto das experiências de relacionamento entre os poderes militar e civil. Na sua componente teórica limita-se a seguir a doutrina já expressa no manual “O Exército na Guerra Subversiva”, apelando à unidade de acção entre militares e civis e enfatizando a importância da conquista e adesão das populações. O aspecto inovador do despacho é conter medidas concretas para a coordenação da luta contra a subversão. Este despacho deu origem a directivas dos comandantes-chefes e governadores em cada um dos territórios.
Em Angola e Moçambique foram criados os Conselhos de Contra-Subversão, onde tinham assento as autoridades militares e civis. Também foi instituída a possibilidade de criação de “Áreas Militares”, que dependeriam do comandante da Região Militar. Estas áreas, uma vez pacificadas, seriam entregues em plenitude à autoridade civil através dos governos dos distritos.
A teoria era boa, a questão foi a sua concretização, pois as acções de contra-subversão dependiam muito das relações entre os comandantes militares e as autoridades administrativas. Num caso extremo, em Moçambique, o Conselho Provincial de Contra- Subversão esteve mais de um ano sem se reunir, dadas as más relações entre o governador-geral, Arantes e Oliveira, e o comandante-chefe, Kaúlza de Arriaga.
Na Guiné, a criação de Áreas Militares nunca se colocou pois que, como escreveu num relatório o inspector Cardoso Allas, da PIDE, na Guiné no tempo do general Spínola “tudo estava militarizado”.
Antecedentes
Em Maio de 1961, por determinação do comandante da Região Militar, general Silva Freire, o Exército implantou em Angola o conceito de quadrícula e semeou unidades no terreno, amarrando-as a ele. De uma força de combate, e sem qualquer decisão política de alto nível, as forças portuguesas passavam a forças de ocupação territorial. Em vez de objectivos, passavam a ter áreas de responsabilidade. Ao optar por esta solução, o Exército deixou de poder justificar a exigência de meios que lhe garantissem elevada mobilidade. Os helicópteros foram concentrados na Força Aérea. Ora, a guerra de contra-subversão é, acima de tudo, uma guerra de mobilidade. A mobilidade exige forças ligeiras e meios que lhes proporcionem rapidez de actuação. Desde a guerra dos franceses na Indochina e, particularmente, da guerra do Vietname, que era conhecida a importância dos meios aéreos e do seu emprego em operações conjuntas com as forças terrestres. Os guerrilheiros moviam-se, o Exército instalava-se. O conceito de operação aero-terrestre só teve plena expressão dentro da Força Aérea, que dispunha das aeronaves para apoio e transporte e dos Pára-quedistas como tropas de combate.
Guerrilha e contra-guerrilha
A guerrilha é uma velha forma de luta dos fracos, mas está longe de ser uma forma fraca de luta. Contrariamente ao que sucede numa guerra convencional – em que se procura a conquista do terreno para, aí, dominar populações –, na guerrilha o “terreno” é a própria população que, uma vez conquistada, permite dominar o território onde a mesma habita. Assim, o guerrilheiro cede às forças que combate o aparente domínio das cidades, dos meios de produção e das vias de comunicação. Esta circunstância permite aos guerrilheiros o conhecimento perfeito de todos os objectivos que podem constituir alvos para
os seus ataques, ficando ao seu inteiro critério a escolha do momento mais oportuno para o seu desencadeamento.
Com as forças que combatem a guerrilha tudo se passa ao contrário: salvo em fases muito adiantadas da guerra revolucionária, os guerrilheiros não ocupam posições fixas às claras, preferindo a ocultação em zonas de difícil acesso ou a disseminação na própria população. Assim, a tendência dominante na guerra revolucionária confere a iniciativa aos guerrilheiros e não às forças de contraguerrilha. A surpresa torna-se, assim, a mais devastadora arma dos rebeldes.
As acções mais comuns da guerrilha durante as campanhas iniciadas em 1961 foram:
Com excepção deste último tipo de acção, todas as outras consentiam pouca ou nenhuma réplica. A maior parte das acções de combate eram de curta duração, de acordo com a táctica do “bate-e-foge”, e a retirada dos grupos guerrilheiros encontrava-se, frequentemente, protegida por engenhos explosivos, que transformavam qualquer perseguição num suicídio inglório.
Como parte da missão de contraguerrilha, as forças portuguesas desenvolviam, fundamentalmente, as seguintes acções:
Acções militares e acções psicológicas
Com bastante menos frequência, as tropas portuguesas conduziam acções de carácter objectivamente mais ofensivo, para exploração de informações, merecedoras de crédito, sobre a localização de forças da guerrilha. Era o caso, nomeadamente, das emboscadas, golpes-de-mão, limpeza de povoações e todas as operações de grande envergadura destinadas a expulsar os grupos guerrilheiros das suas zonas de refúgio. A ineficiência operacional resultante da adopção de um dispositivo de quadrícula obrigou a um desenvolvimento – sem paralelo entre outros exércitos envolvidos em guerras coloniais – das forças especiais, quase as únicas que estavam em condições de levar a cabo operações ofensivas.
No plano da manobra psicológica, englobando tarefas que, obrigatoriamente, decorriam da responsabilidade territorial inerente ao dispositivo de quadrícula, merecem relevo as acções levadas a cabo pelas Forças Armadas Portuguesas em sentido construtivo. Sendo de vital importância o controlo das populações, fazia parte da táctica da contraguerrilha o apoio social às populações autóctones, procurando-se, deste modo, cativá-las. Esse apoio abrangia a assistência
médica, o ensino e a construção civil.
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