1961 - O princípio do fim do império

O GOLPE BOTELHO MONIZ

O Golpe Botelho Moniz foi uma tentativa de golpe palaciano, um pronunciamento militar para impor uma solução política para o Ultramar no sentido da autodeterminação.

A acção começou a 11 de Abril, quando o Exército entrou de prevenção.

Kaúlza de Arriaga, sem autorização superior, respondeu e deu a mesma ordem à Força Aérea. No dia seguinte, Salazar ordenou ao ministro da Marinha, Quintanilha Dias, que pusesse a Marinha de prevenção.

Entretanto, Botelho Moniz e Almeida Fernandes forçaram uma reunião com Américo Tomás que, numa estratégia de ganhar tempo, só os recebeu por volta da meia-noite. A reunião correu mal para Botelho Moniz, que se chegou a travar de razões com Almeida Fernandes à frente de Tomás.

Após esta reunião, Tomás comunicou por carta a Botelho Moniz a sua intenção
de reiterar a sua confiança em Salazar.

Depois de todo este tempo perdido, Botelho Moniz convocou, para 13 de Abril às 17 horas, uma reunião na Cova da Moura com os altos comandos das Forças Armadas, incluindo os comandos das Regiões Militares, para decidir a passagem à acção. Todos os comandos foram avisados desta reunião, até Kaúlza, que, por sua vez, avisou Américo Tomás e o chefe do Estado-Maior da Força Aérea, regressado nesse dia do estrangeiro.

Botelho Moniz ainda tentou reunir-se com o embaixador americano para este, mais uma vez, lhe garantir o apoio dos Estados Unidos. Mas o embaixador recusou esta reunião, mesmo em cima do acontecimento.

Botelho Moniz com oficiais das Forças Armadas. [AHM]

Ao fim de quase três semanas de diligências infrutíferas e de ter dado a conhecer todos os seus trunfos, Botelho Moniz marcou uma reunião para decidir não só a passagem à acção, mas a acção ela mesma, pois nem sequer plano de operações havia.

Aparentemente, a única acção do ministro da Defesa foi uma ordem, a 12 de Abril, para que dois batalhões da Escola Prática de Infantaria em Mafra avançassem sobre Lisboa, um para cercar o Palácio de S. Bento e outro a Emissora Nacional.

Às 15 horas do dia 13 de Abril os golpistas foram surpreendidos pelo contra-ataque de Salazar ao ouvirem na Emissora Nacional a leitura de um comunicado dando conta da demissão do ministro da Defesa e dos outros membros do Governo envolvidos.
Santos Costa e Kaúlza de Arriaga utilizaram a Legião Portuguesa e os Pára–quedistas para cercar a Cova da Moura.

Seguiu-se o discurso de Salazar ao país, em que deu as razões das demissões – “Para Angola, rapidamente e em força” – anunciando, ao mesmo tempo, que assumia a pasta da Defesa, dando a entender que esta tinha sido mal conduzida.

Entretanto, o novo CEMGFA, general Gomes de Araújo, deu ordens aos comandantes das Regiões Militares para não irem à reunião na Cova da Moura, ordem a que estes desobedeceram.

Quando a reunião se realizou, às 17 horas, já foi, formalmente, uma reunião conspirativa e clandestina. O marechal Craveiro Lopes compareceu a esta reunião com uma mala com o seu uniforme de gala para fazer uma comunicação ao país, mas era tarde de mais. O golpe tinha falhado. Seguiram-se treze anos de guerra.

Américo Tomás, Kaúlza de Arriaga e Costa Gomes, três personagens decisivos no desenrolar do golpe de 13 de Abril. [AHM]

Por que falhou o golpe Botelho Moniz?

Falhou porque era um golpe de generais para generais, só com as cúpulas das Forças Armadas, evitando cuidadosamente o envolvimento de outros oficiais ou de civis. O país não sabia de nada e, segundo os seus mentores, não tinha de saber e era melhor que não soubesse.

Sendo um golpe da evolução na continuidade, também não pôde socorrer-se do apoio popular, de que nunca cuidou.

Para Angola e em força.

Em 14 de Abril, na posse dos novos membros do Governo, Salazar pronunciará a famosa frase “Para Angola, em força”. Tinha passado um mês sobre o início dos massacres no Norte de Angola, com a morte de centenas de brancos e de milhares de negros, quando Salazar falou.

Durante esse mês, Angola manteve os mesmos efectivos de que dispunha em 1960, desde a independência do Congo: 5000 militares do recrutamento local 1500 de reforço enviado da Metrópole – as Companhias de Caçadores Especiais.

Restabelecido no poder, Salazar pôde lançar o seu grito de guerra. Inicia-se então uma impressionante vaga de unidades mobilizadas para Angola. De Abril até Dezembro partem para Angola 24 Batalhões de Caçadores, 87 Companhias de Atiradores, três Companhias de Engenharia (sapadores, transmissões e construção), três Comandos Operacionais (COP), duas Companhias e dois Pelotões de Polícia Militar, três Pelotões de Canhões Sem Recuo, 16 Pelotões de Morteiros, duas Baterias de Artilharia de Campanha e mais um grande contingente de unidades de apoio de serviços: uma Companhia de Intendência e 19 Destacamentos de Intendência, 13 Destacamentos de Manutenção de Material, uma Companhia de auto macas e até um Destacamento de Sapadores de Caminhos-de-ferro. Mesmo em Angola, o dispositivo militar com base no recrutamento local foi aumentado com três Batalhões e quatro Companhias de Caçadores, dois Esquadrões de Reconhecimento, um Comando de Agrupamento, duas Estações Postais. Também foi criado o Hospital Militar de Luanda, com pessoal mobilizado em Portugal e de recrutamento local.

No final do ano já estarão em Angola cerca de 33 000 homens.

Esta capacidade de rápida e massiva mobilização significa que, ao contrário do que Salazar tentou fazer crer, ao demitir o ministro e o secretário de Estado do Exército, Almeida Fernandes e Costa Gomes, respectivamente, acusados de envolvimento no golpe de Botelho Moniz, estes haviam feito o seu trabalho de planeamento para a mobilização de forças para África.

Sendo assim, resta saber por que Salazar não enviou antecipadamente uma parte das forças que foram mobilizadas em tão pouco tempo e que poderiam ter evitado a chacina de 15 e 16 de Março, sabendo, como sabia, que acontecimentos graves estavam a ser preparados por parte da UPA.

Justificações para a estranha inacção de Salazar

Têm sido muitas as justificações para o mistério da inacção de Salazar.

Umas de ordem racional, outras mais subjectivas.

As de carácter racional apresentam Salazar como um político frio, calculista e cínico que, ao deixar os acontecimentos atingirem tão elevado grau de dramatismo como o que as imagens de massacres ou violência indiscriminada necessariamente provocariam entre os portugueses da Metrópole e de Angola, pretendeu explorar três vantagens políticas:

– Causar, através das emoções, uma vaga de apoio a si e ao seu regime, enfraquecido pela campanha de Humberto Delgado e pelo assalto ao navio Santa Maria.

– Esvaziar a contestação das cúpulas militares portuguesas, chefiadas pelo ministro da Defesa, Botelho Moniz, e tuteladas pelo antigo presidente da República, Craveiro Lopes, e que ele sabia estarem a preparar um golpe contra si.

– Colocar os americanos da administração Kennedy em xeque, apresentando-os como apoiantes de sanguinários terroristas.

As razões subjectivas têm sido adiantadas por Adriano Moreira, que foi nomeado ministro do Ultramar na remodelação que se seguiu ao falhado golpe Botelho Moniz.

Adriano Moreira apresenta Salazar nesta época como um velho de 73 anos, cansado e desconfiado, que já não superava as consequências da solidão, perplexo perante um mundo em mudança que já não era o seu. Um homem incapaz de reagir aos desafios à sua autoridade, vindos de ministros e generais, hesitante entre a imposição de castigos aos indisciplinados e o apoio aos seus fiéis. Um chefe de governo que raramente reunia o conselho de ministros e frequentemente consumia as audiências de trabalho falando das suas antigas experiências; e que se interessava por questões menores para adiar algum problema urgente que não queria abordar. Um homem deprimido, que passava os dias rodeado pela família artificial que criara à volta da sua governanta Maria de Jesus e que deixava passar longos meses sem ver necessidade de receber os seus ministros.

Partida do navio Niassa com tropas para Angola. [AHM]

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