Difusão de uma carta de Iko Carreira aos militantes do MPLA, preparando a luta urbana.
Esta carta circular, apreendida pelos serviços de informações militares, transmitia orientações às estruturas do MPLA para a preparação e o desenvolvimento de actividades clandestinas “nas cidades e outros centros urbanos”.
A intenção das autoridades portuguesas era alertar os militares para esta possibilidade de guerrilha, ou terrorismo urbano e reforçar as medidas de segurança militar (Perintrep 558 de 17 de Abril 1969 do QG/RMA).
A carta
“A actividade urbana é fundamentalmente clandestina, embora alguns membros da rede devam realizar tarefas de carácter semi-público.
Como o ocupante põe um cuidado muito especial na liquidação e repressão de toda a acção nacionalista de tipo urbano, devemos fazer muita atenção na escolha dos membros e responsáveis da rede clandestina…”
A actividade clandestina nos centros urbanos devia ser realizada através de três grandes linhas de acção e trabalho: o reabastecimento e financiamento, a informação e a mobilização, e a acção armada.
A carta atribuía tarefas e orientações aos responsáveis de cada uma destas áreas e adiantava:
“é preciso não esquecer os estudantes que hoje representam uma massa contestatária e dinâmica muito importante… eles poderão ser organizados no seio da “União dos Estudantes Angolanos”.
A questão da guerrilha urbana dos movimentos de libertação
Durante a guerra foram muito raras as acções de guerrilha urbana nos três teatros de operações. Em Angola, na Guiné e em Moçambique, a luta desenrolou-se quase exclusivamente em áreas rurais, nas “matas” e nas vias de comunicações.
A explicação mais habitual para esta ausência de terrorismo urbano tem sido a eficácia da PIDE/DGS, que conseguia desmantelar todas as redes clandestinas formadas nos centros urbanos antes de elas se tornarem operacionais.
A eficácia da PIDE/DGS só explica em parte essa ausência, pois a Boss sul-africana e a CIO da Rodésia eram polícias secretas igualmente eficazes e não evitaram acções de terrorismo nos seus territórios.
A explicação mais plausível parece ser a de que as tensões sociais entre os vários grupos que conviviam nos centros urbanos – colonos europeus, africanos em diversos graus de integração social e de consciência política – nunca foram suficientes para os fazer passar à fase do terror. A ausência de terrorismo nos centros urbanos parece configurar a possibilidade de convívio entre os vários grupos que, como aconteceu muitas vezes na colonização portuguesa, partilhavam elementos comuns através dos laços de parentesco.
Estes laços terão sido, talvez, a causa mais forte para os movimentos de libertação terem evitado investir decididamente no terrorismo urbano, com todo o seu cortejo de dramas. Isso mesmo fazia parte dos seus planos de actuação.