04/11/1971 -

Criação formal do Grupo de Trabalho Madeira na ZML, em Angola, com vista à continuação dos contactos com a UNITA.

O GT Madeira era presidido pelo chefe do Estado-Maior da ZML, coronel Ramires de Oliveira, e integrava elementos da DGS. A partir deste mês cessou toda a actividade da UNITA contra as forças portuguesas.

Operação Madeira

Em 1971, a UNITA vivia uma situação de grande dificuldade. O movimento de Savimbi tinha sido expulso da Zâmbia, não tinha apoios externos, tinha falta de material de guerra e de meios de sobrevivência e estava acantonado numa região na área do Lucusse, Gago Coutinho. O MPLA tentava controlar todo o Leste e atacava a UNITA. As forças portuguesas controlavam a situação desde 1969. Em 1971 os militares portugueses consideravam que a UNITA não representava perigo e
que podia ser útil no combate ao MPLA.

Para as autoridades portuguesas, a Operação Madeira foi uma tentativa relativamente bem sucedida e sem riscos militares e políticos de neutralizar um pequeno inimigo e ganhar um aliado útil contra o inimigo principal, o MPLA.

Dentro da estratégia portuguesa para o Leste de Angola de manter o conflito ao mais baixo nível de intensidade possível, esta aliança era bem-vinda.

Os militares portugueses pretendiam estabelecer um acordo para obter maior segurança nas zonas onde a UNITA actuava, o que implicava que a UNITA fosse um obstáculo às “intenções expansionistas do MPLA” e se encontrasse uma solução política para os quadros políticos da UNITA, isto é, tentar que Savimbi aceitasse integrar a administração portuguesa.

Para a UNITA, os objectivos que pretendia alcançar eram bem diferentes e limitavam-se quase a sobreviver. Em 1971, Savimbi não lutava pela independência de Angola, lutava para ser reconhecido como um líder nacionalista em igualdade de posição com Agostinho Neto e Holden Roberto, e lutava para manter à sua volta algumas forças capazes de fazerem “prova de vida” da organização, através da realização de algumas acções. A aliança com os portugueses era-lhe vantajosa. Em troca de alguns ataques ao Caminho-de-Ferro de Benguela, que a PIDE atribuía ao MPLA, o que possibilitava ao Governo português pressionar a Zâmbia para limitar o apoio a este movimento, as autoridades militares da ZML forneciam à UNITA algumas armas de repetição Mauser e algumas munições (que eram marcadas para que não fossem empregues contra as forças portuguesas), que a UNITA utilizava para caçar.

Em termos operacionais, a situação era conveniente aos dois lados e clara – as forças portuguesas tinham um reforço nos guerrilheiros da UNITA para combater o MPLA e a UNITA podia orientar os seus esforços sem a preocupação de ser atacada pelos militares portugueses.

Quanto ao aspecto político, já não foi tão claro o entendimento. Os militares portugueses da ZML, com bastante falta de sensibilidade política, mandaram uma carta a Savimbi, a 23 de Janeiro de 1972, em que o informavam que ele seria tratado só como português, esclarecendo: “Um português que até aqui tem conduzido uma guerra subversiva, mas português…”; mais adiante, ao explicarem esta concessão de ser português, os militares da ZML concediam: “Nem vós podereis ser considerados estrangeiros nesta terra que é Portugal, nem nós em Angola que deve muito aos seus naturais, mas muito mais aos que doutras terras para aqui vieram…”.

Savimbi conhecia o destino dado pelas autoridades portugueses a muitos “portugueses” que conduziram guerras subversivas e respondeu declarando-se ofendido
por ter sido assim tratado, constatando estar a dialogar com pessoas que não conheciam a gramática política. De facto, ele era, para todos os efeitos, um líder nacionalista angolano. Como o Grupo Madeira também lhe pedira para ele garantir a segurança do Caminho-de-Ferro de Benguela na sua área de implantação, Savimbi respondeu com ironia que não era da milícia portuguesa.

Apesar destes equívocos, a UNITA continuou a combater o MPLA, a salvo dos ataques dos militares portugueses. A estratégia de Savimbi era a de evitar que o MPLA viesse a transformar-se no único representante reconhecido do povo de Angola numa futura independência e, ao manter este diálogo com as autoridades portuguesas, mantinha em aberto a possibilidade de integrar uma solução que não fosse uma independência do MPLA.

Nas relações de Savimbi com as autoridades portuguesas de Angola não existiu nenhuma ambiguidade – ele era um político experiente que se posicionava para desempenhar um papel central nas soluções do futuro. Tentava evitar as soluções que não lhe interessavam, no caso a supremacia do MPLA, e apoiava-se num aliado de circunstância, as autoridades portuguesas, numa época de expectativa.